23 janeiro 2011

Com o que se ocupa a sua mente?

Pregação proferida na cerimônia de colação de grau da turma 2010 de Teologia do Seminário Teológico Batista do Ceará, realizada no auditório do Colégio Batista Santos Dumont em 15/01/11


SAUDAÇÕES

Boa noite, irmãos. Saúdo com alegria todos os que vieram aqui celebrar este momento especial, que é a colação de grau dos alunos do curso de teologia do Seminário Teológico Batista do Ceará.

Minha saudação inicial ao presidente da Convenção Batista Cearense, pr. Abdoral Henrique, e sua diretoria, bem como ao demais membros do Conselho Diretor da CBC: graça, paz e sabedoria da parte de Deus sobre suas vidas, irmãos; Também saúdo a equipe de direção do STBC na pessoa da Reitora, pra. Maria Antonieta, bem como à Junta Adminstrativa do Seminário: que o Senhor os fortaleça, irmãos.

A bíblia nos aconselha a alegrar-nos com os que se alegram. Foi fácil pra mim seguir esse conselho hoje. Estou muito alegre em partilhar da alegria dos nossos amados irmãos que hoje completam um etapa importante de suas vidas.

Minha alegria se multiplica quando percebo que participei da vida de alguns deles como colega em sala, como Professor, Deão Acadêmico e Reitor; principalmente porque a exposição mútua pela qual passamos nesses diferentes contatos, ao invés nos afastar uns dos outros, nos levou a uma boa e saudável amizade. Que os créditos desse milagre sejam dados ao Senhor.

Também estou alegre em ver aqui amigos queridos, colegas de ministério, professores e funcionários do STBC, além da presença alegre das famílias, parentes e amigos dos formandos. Que o Senhor abençoe a todos conforme sua sábia vontade. 

INTRODUÇÃO

Perguntas nem sempre são fáceis. Na vida de uma pessoa comum há momentos em que devemos responder as perguntas que nos são feitas. São entrevistas, esclarecimentos ou conversas informais nas quais somos convidados a falar sobre quem somos, o que pensamos e no que acreditamos.  

Na verdade, há quem se sinta incomodado com perguntas e fuja delas a léguas, como os políticos que preferem escamotear seus intentos e disfarçar seus planos, ainda que o dito popular seja claro: perguntar não ofende.

Por outro lado é interessante perceber que Jesus era mestre em fazer perguntas: “De quem é a imagem cunhada na moeda?”... “E os outros nove, onde estão?”... “O que queres que eu faça por ti?”... “Mulher porque choras?”... “Tu me amas?”. As perguntas dele vão ao âmagos das questões, deixando de lado aquilo que é secundário.

Esta noite, a partir de um orientação dada pelo apóstolo Paulo ao jovem pastor Timóteo, quero conduzí-los a fazerem uma pergunta para si mesmos e espero que essa pergunta continue a ecoar em suas almas por muito tempo. Vejamos primeiro o texto:


1  Paulo, apóstolo de Cristo Jesus, por mandato de Deus, nosso Salvador, e de Cristo Jesus, nossa esperança, 2  a Timóteo, verdadeiro filho na fé: graça, misericórdia e paz da parte de Deus Pai e de Cristo Jesus, Nosso Senhor. 3  Quando parti para a Macedónia, recomendei-te que ficasses em Éfeso, para dissuadir alguns de ensinarem doutrinas estranhas  4  E de se ocuparem de fábulas ou de genealogias intermináveis, que favorecem mais as discussões do que o desígnio de Deus que se realiza na fé. (1Tm 1:1-4) 

O CONTEXTO

O apóstolo Paulo já era um homem experimentado quando escreveu para Timóteo dando-lhe conselhos e orientações sobre alguns aspectos de sua vida pessoal e de serviço ao corpo de Cristo.

Por sua vez, Timóteo era um jovem líder que começava a servir ao corpo vivo de Cristo e estava cheio de dúvidas sobre a forma, os limites, os propósitos, as implicações do seu serviço. Talvez por isso, as duas cartas escritas a Timóteo estão repletas de palavras de encorajamento, exortações e orientações.

Nos versos que lemos, Paulo lembra a Timóteo que o motivo pelo qual ele (Timóteo) ficou na cidade de Éfeso era para dissuadir algumas pessoas que estavam se ocupando de fábulas e genealogias, ensinando doutrinas estranhas e com isso provocando discussões intermináveis ao invés de favorecer ao designio de Deus.

Uma das características do mundo antigo era que os poetas, e alguns dos historiadores, se deleitavan em escrever historias românticas e fictícias sobre a fundação das cidades e a origem das famílias. Falavam de algum deus que havia descido à terra e fundado cidades, ou casado com alguma jovem mortal e criado uma família. O mundo antigo estava cheio de fabúlas nesse estilo.

Havia também uma verdadeira paixão pelas genealogias. Podemos ver isso até no Antigo Testamento com seus capitulos de nomes e no novo testamento com a genealogia de Jesus. Alexandre Magno, por exemplo mandou que construíssem um verdadeiro pedegree totalmente artificial em que se traçava sua descendência até Aquiles, Perseu e Hércules..

As pessoas se ocupava com essas fabúlas e genealogias, participando de discussões calorosas; mas todo esse esforço só produziam controvérsias vazias de bons propósitos, que acabavam por afastar as pessoas dos designios de Deus, que é pela fé.

Em Éfeso também havia muita gente que se ocupava em ensinar doutrinas estranhas (em algumas traduções: doutrinas erradas, doutrinas falsas, doutrinas diferentes ou outra doutrina).

Essa é uma expressão que sempre me chamou a atenção, porque é, quase sempre compreendida à luz daquilo que a pessoa que lê julga que seja correto. Isto é, doutrinas erradas são aquelas que dizem algo diferente daquilo que eu acredito, doutrinas falsas são aquelas que contradizem a minha crença, outra doutrina é aquela que não está na confissão de fé da minha igreja ou denominação.

Ora, quando Paulo escreveu essa carta a Timóteo não havia ainda o cânone, isto é, o que hoje conhecemos como Bíblia ainda não existia. É claro que também não havia as declarações de fé denominacionais e o credo apóstólico ainda estava em formação. Então, a que se refere o apóstolo quando fala de doutrinas estranhas?

A melhor explicação do texto é o próprio texto. Paulo lembra a Timóteo que o motivo para que ele permanecesse em Éfeso era dissuadir aqueles que se ocupavam de fábulas, genealogias e doutrinas estranhas, porque essas coisas estavam afastando as pessoas do designio de Deus, que é pela fé.

Ou seja, as doutrinas eram estranhas ao plano de Deus para humanidade que é pela fé, eram diferentes do evangelho de Cristo que é pela graça, eram falsas porque não correspondiam à obra que Deus se propôs a fazer em nós; eram outras doutrinas porque não eram a Boa Nova da bondade de Deus que nos liberta do nosso desejo de sermos dignos ou merecedores, sendo misericordioso conosco por causa de Cristo Jesus.
   
A PERGUNTA

Ao olhar para fábulas, genealogias e doutrinas estranhas com as quais os irmãos de Éfeso estavam se ocupando, a pegunta que tenho feito para mim mesmo, e que hoje à noite proponho que você faça se faça é: com o que eu tenho ocupado minha vida?

Essa é uma pergunta que pode ser feita independente do ponto em que você se encontra em sua caminhada com Cristo, então, seja você um dos respeitáveis anciãos de sua comunidade, um jovem com sonhos de liderança, ou alguém que conheceu a amor de Deus há poucos dias, eu o convido a perguntar para si mesmo: com o que eu tenho ocupado minha vida?

DOUTRINAS ESTRANHAS

Os irmãos de Éfesos estavam prestando atenção a idéias (ou doutrinas) que não concordavam com o evangelho de Jesus. Eles estavam ocupados em encontrar nas lendas e genealogias algo que os tornassem pessoas respeitáveis. Eles construiam suas próprias histórias, muitas vezes negando a realidade dos fatos,  para que pudessem ser vistos pelos demais e quem sabe por Deus como homens de bem, sensatos, justos e bondosos. Mas esse esforço não tem a ver com as Boas Novas da salvação, santificação e glorificação pela Graça de Deus em Cristo Jesus.

Em nossos dias há muitas idéias (estranhas) ao Evangelho; Algumas novas e outras antigas. Quem se ocupa com essas ideias (ou doutrinas) não verá produzidos em sua vida os doces frutos do Espírito de Deus (amor, alegria, paz, paciência, amabilidade, bondade, fidelidade, mansidão e domínio próprio), porque elas conduzem ao designio de Deus, que é pela confiança. Vejamos algumas dessas ideias.

Individualismo

O modo de pensar individualista é aquele em que a pessoa considera que precisa apenas de si mesmo para existir. Quem ocupa sua mente com o individualismo considera as outras pessoas como figurantes dispensáveis em um filme no qual ele é o personagem principal.

O individualismo é capaz de corromper até as boas ações porque a pessoa ocupada consigo mesmo, mesmo quando tenta fazer o bem pensa mais em si mesmo do que no outro e pode acabar fazendo o que é melhor para si mesmo. Essa doutrina é estranha ao evangelho de Jesus.

O mesmo apóstolo Paulo, ecoando o pensamento de Cristo, fala de outra maneira: “Não pensem só em si mesmos. Procurem pensar no seu semelhante também e no que é melhor para ele.”  (1Co 10:24  BV). Veja que diferença entre esses dois pensamentos produzirá também modos de vida diferentes. A pegunta é difícil, mas você precisa fazer: com qual dessas ideias você tem ocupado a sua mente?

Denominacionalismo

Denominacionalismo é uma versão moderna das fábulas e genealogias. No mundo antigo as pessoas buscavam encontrar credibilidade para si mesmos a partir de histórias sobre suas famílias e suas cidades. Queriam ser consideradas pessoas de boa reputação por causa e usavam as fábulas e genealogias para se apresentarem como homens de bem.

Hoje se busca a mesma coisa na história das igrejas e denominações: nossas doutrinas, nossas crenças, nossas instituições, nossas bandeiras, nossos ícones, nossos costumes: isso é que nos da identidade e nosso apego a essas coisas que nos faz pessoas de bem. Mas esse pensamento não é conforme o evangelho de Jesus.

Diante da tentiva dos judaizantes  de obrigar os seguidores de Jesus a se apegarem aos símbolos denominacionais dos judeus (sábados, comidas, leis e costumes) como um porto seguro, sob a ameaça de não serem aceitos por Deus, Paulo, falou o seguinte:

4  Ainda que eu tenha razões para, também eu, pôr a confiança precisamente nos méritos humanos. Se qualquer outro julga poder confiar nesses méritos, eu posso muito mais: 5 circuncidado ao oitavo dia, sou da raça de Israel, da tribo de Benjamim, um hebreu descendente de hebreus; no que toca à Lei, fui fariseu; 6  no que toca ao zelo, perseguidor da Igreja; no que toca à justiça - a que se procura na lei - irrepreensível. 7  Mas, tudo quanto para mim era ganho, isso mesmo considerei perda por causa de Cristo. 8  Sim, considero que tudo isso foi mesmo uma perda, por causa da maravilha que é o conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor: por causa dele, tudo perdi e considero esterco, a fim de ganhar a Cristo 9  E nele ser achado, não com a minha própria justiça, a que vem da Lei, mas com a que vem pela fé em Cristo, a justiça que vem de Deus e que se apoia na fé. Flp 3:4-9  (DIF)

Sobretudo, devemos lembrar que o filho de Deus não considerou a sua história na eternidade uma coisa à qual devesse se apegar. Sua decisão de fazer-se gente e vir a este mundo é a maior prova de que o grande chamado de Deus é para confiarmos não em nossas histórias ou tradições, mas apenas e tão somente nele e no seu amor por nós. Com qual dessas idéias você tem ocupado sua vida?

Consumismo

O consumismo é a ideia (ou doutrina) de que o valor das pessoas é medido por meio da capacidade delas de adquirir coisas, benefícios ou bem-estar. Por isso, quem se ocupa com o consumismo é levado a acreditar que vale a pena fazer tudo o que for possível para se tornar alguém que pode comprar.

Todos nós, desde o Eden, somos carentes quanto ao nosso senso de valor , por isso a doutrina do consumo, que oferece a esperança de sermos importantes, é  capaz de entortar o bom caminho de evangelho e levar as pessoas a fazerem qualquer

Assim, quem se ocupa com essa doutrina estranha é capaz de comprar sem ter com o que pagar, abortar uma criança para não reduzir o padrão de vida, negar ajuda a alguém necessitado, ser desonesto nos negócios ou sonegar impostos. Mas esse pensamento não é conforme o evangelho de Jesus. Ouça o que diz o próprio Jesus sobre a questão:

24  “Vocês não podem servir a dois patrões: Deus e o dinheiro. Porque vocês odiarão um e amarão outro, ou vice versa”. 25  “Portanto, meu conselho é: Não fiquem preocupados a respeito de coisas: O que comer, o que beber e o que vestir. Porque vocês já têm a vida e o corpo - e ele são muito mais importantes do que o comer ou o que vestir”. (... )31  “Portanto não se preocupem de forma alguma com a necessidade de comida e roupa suficientes. 32  Não sejam como os pagãos! Pois eles se orgulham dessas coisas todas, e estão muitíssimos interessados nelas. Mas o Pai celeste, que vocês têm, já sabe muito bem que vocês precisam delas”, 33  “E Ele as dará a vocês, se O colocarem no primeiro lugar de suas vidas”. 34  “Portanto não fiquem preocupados com o dia de amanhã. Deus cuidará do dia de amanhã para vocês também. Já é suficiente a preocupação de cada dia”. Mat 6:24-34 

Qual a ideia que tem ocupado sua mente? A doutrina estranha de que consumir é que faz de você alguém importante ou as palavras de Jesus, ao afirmar que somos importantes para Deus por quem somos: filhos dele?

OUTRAS DOUTRINAS

Essas e outras doutrinas estranhas estão sempre nas prateleiras se oferecendo para ocupar nossas mentes e corações: O secularismo, que consiste em desistir da transcendência das coisas eternas e tentar extair significado eterno de coisas passageiras; o determinismo que nega a possibilidade de que as decisões humanas afetem o rumo da história; o positivismo que restringe à ciência a possibilidade de chegar a uma verdade objetiva.

CONCLUSÃO

Para concluir, volto ao começo de nosso raciocínio mas agora com uma outra pergunta que talvez tenha tomado conta de sua mente: com o que devo me ocupar quando abrir mão das doutrinas estranhas que hoje fazem parte de minha vida? Novamente o texto explica o texto: As doutrinas foram chamadas de estranhas porque elas não concordavam com o plano de Deus, que é pela fé.

Esse plano de Deus é a restauração nosso relacionamento com Ele e uns como os outros de maneira que aprendamos a viver neste mundo experimentando confiança Nele.

Então, entendo que devemos nos ocupar com ideias, opiniões e modos de viver que confirmam esse propósito de Deus em nossas vidas. Para isso é preciso que você renove sua mente. Esse é o conselho de Paulo na carta que escreveu aos irmãos de Roma.

Você precisa renovar sua mente.

Quando você perceber que doutrinas ou ideias com as quais tem se ocupado não são coerentes com a obra de Deus em você, que é pela fé, descarte-as por mais apegado que você esteja a elas. Não permita que nenhuma doutrina estranha, seja ela nova ou antiga, torne o nosso Pai querido alguém distante e protocolar, e a obra de Cristo na Cruz algo desprezível. Mude a direção da sua vida.

Não se conforme às fábulas e genealogias, isto é, não assuma as formas de pensar que ligam você a valores que são estranhos as valores do Reino Deus. Ao invés disso permita que sua mente seja renovada pela Palavra Viva de Deus: Jesus.

Finalmente, irmãos, tudo o que é verdadeiro, tudo o que é respeitável, tudo o que é justo, tudo o que é puro, tudo o que é amável, tudo o que é de boa fama, se alguma virtude há e se algum louvor existe, seja isso o que ocupe o vosso pensamento. Flp 4:8 

Meus queridos irmãos formandos, que o Senhor os socorra em suas limitações e encha seus corações de esperança. Creiam com sinceridade no poder e na vontade divina de nos transformar à imagem de seu filho Jesus Cristo. É que seus pés, no que depender de vocês, dêem, todos os dias, passos em direção àquele que é o nosso salvador: Jesus Cristo. Amém.

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