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03 julho 2012

Espírito Santo e Batismo



Estou chegando com as discussões já a todo vapor, mas certamente não poderia deixar de tentar contribuir com minha posição sobre o assunto, que é controverso mas de suma importância.

Creio pela revelação da Palavra e pelo testemunho em meu próprio espírito que é pelo Espírito Santo (ES) que somos conquistados para Deus. Ele nos atrai, convence, regenera, encoraja, consola, corrige e nos preserva para o último dia. Portanto, não há vida em Cristo se não houver a ação poderosa do Espírito a produzir em nós novas pessoas outorgando-nos a posição de filhos e zelando por nossa caminhada com Cristo.

Entendo que a guerra de preposições (em, no, dentro, fora, ao redor... sei lá!) quanto à forma de atuação do Espírito não ajuda muito, mas confunde bastante. Essa tentativa de esquadrinhar os movimentos e atuações do ES vai contra a sua natureza (o vento sopra onde quer). Portanto me atenho à verdade simples de que o ES é o mover poderoso do Deus trino: ele age em todo o universo e sob todas as preposições que possamos imaginar.

Minha interpretação dos textos bíblicos me leva a compreender os eventos dos primeiros capitulo de Atos, quando o Espírito cumpre a profecia de Jesus (E também de Joel), como um momento peculiar e único no tempo. Nem os que experimentaram, ou mesmo os que relataram os fatos, o fizeram como se fossem normativos ou como exigência para isso ou para aquilo. Acho, portanto, que a leitura a posteriori em busca de regras e normas a serem aplicadas em todos os tempo é um caminho limitador; uma tentativa de controlar o agir de Deus.

Estou convicto de que o ES passa a habitar de forma plena e irreversível na vida daqueles que abrem mão de suas próprias soluções e depositam sua confiança, ainda que frágil, no amor de Deus revelado em Jesus Cristo. Neste momento, creio, aquele que se rendeu ao amor de Deus é mergulhado no Espírito Santo e selado para a eternidade (e ninguém o arrebatará das mãos Dele). Este batismo no Espírito é a porta de entrada para a comunidade daqueles que foram remidos pelo sangue do cordeiros, tiveram seus nomes escritos no livro da vida e receberam o selo da adoção que os permite falar: Abba Pai.

Ao ler os textos bíblicos (não apenas em Atos, mas também nas cartas paulinas) sou levado a concluir que o batismo nas águas tem grande importância simbólica daquilo que já ocorreu na vida do seguidor de Jesus: ao mergulhar, morte para o mundo; ao emergir, ressurreição para uma nova vida - a vida do ES em nós. Portanto não vejo no batismo em si qualquer comunicação de graça ou poder para remir pecados. Não desprezo, no entanto, o simbolismo que decorre do entendimento de que fomos regenerados como membros de um nova família e com ela assumimos compromissos e responsabilidades.

Entendo também que os seguidores de Jesus carecem profundamente da ação e do poder do ES para viverem sua nova vida. O derramamento do ES acontece de forma contínua na capacitação que recebemos para viver a vida de Cristo. Por outro lado, esse mesmo Espírito será percebido de forma especial quando somos empoderados e capacitados a proclamar com ousadia a mensagem do evangelho.


Aristarco Coelho


Texto extraído e editado a partir do fórum de discussão realizado no contexto da disciplina "Temas do Novo Testamento" tendo como assunto "Batismo no Espírito Santo". Fórum realizado dentro do formato proposta pela EST - Escola Superior de Teologia.

01 julho 2012

Salvação pela integridade?




Seu ponto de vista está começando a ficar mais claro, Simone, no entanto ainda tenho algumas dúvidas sobre o comentário anterior e outras que surgiram a partir de seu novo comentário.

Você apresenta a salvação como resultado de um mix de fé e vida íntegra, isto é, a pessoa precisa confiar em Jesus e apresentar determinados comportamentos, como integridade e retidão, para ser aceita por Deus. Embora compreenda, como já afirmei em outro comentário, que a fé produz uma vida íntegra que agrada a Deus, não posso concordar que a integridade é que resulta em nossa aceitação por Deus. Ele nos salvou por sua graça e misericórdia quando estávamos mortos em nossos delitos e pecados, portanto nosso nível de integridade era zero.

Acho que compreendi a relação que você fez entre fé e graça, mas tenho algumas restrições aos termos usados. Prefiro o entendimento de que a fé não é um instrumento para nos apoderarmos da Graça, mas sim um relacionamento de confiança crescente em resposta ao amor de Deus por nós; também acho que nosso contato com a Graça de Deus não se dá em termos de "apoderamento", como se o processo estivesse sob nosso controle, mas compreendo que somos alcançados por esta graça em uma iniciativa que não é nossa.

Não compreendi bem o que seria o "estado de graça" a que você se referiu nesse último comentário. Por outro lado, entendo que é a graça de Deus, expressa no amor em forma humana chamado Jesus, que destranca as portas da desconfiança para que minha resposta de fé seja possível. Assim, é a graça de Deus que conduz à fé, e é a confiança em Deus que resulta em salvação. Isto era assim no AT e é assim a partir de Cristo

É interessante este diálogo porque embora a palavras que estamos usando sejam as mesmas o significado que damos elas são diferentes. Ainda assim estamos juntos no propósito de caminhar com Cristo em novidade de Vida.

Aristarco Coelho




Texto extraído e editado a partir do fórum de discussão realizado dentro do contexto da disciplina "Temas do Novo Testamento" tendo como assunto "Exclusivismo, inclusivismo e pluralismo religioso". Fórum realizado dentro do formato proposta pela EST - Escola Superior de Teologia.

28 junho 2012

História da igreja na AL - Questões introdutórias


Síntese do texto "Temas da História da Igreja na América Latina: Questões introdutórias e periodizações" escrito por Wilhelm Wachholz. Produzido dentro dos limites de forma exigidos pela EST - Escola Superior de Teologia como requisito da disciplina História da Igreja na América Latina.

Igreja Encarnada: o Já e o Ainda não 

As indagações iniciais do texto repousam sobre a pertinência de uma “História da Igreja”. Fundamentado na encarnação de Jesus, que se submeteu à história humana ( Deus fazendo-se história junto com sua criação), o autor advoga que da mesma forma a natureza da Igreja não é etérea, mas encarnada, submetida aos processos históricos humanos. Assim, a igreja do primeiro século estava relacionada às circunstâncias históricas lá existentes, enquanto a igreja do século XXI é chamada a lidar com os desafios deste século. Conclui o autor que, portanto, não é possível “conhecer e compreender a igreja se não conhecermos sua história”.

Parece bastante razoável o entendimento de que a Igreja, feita de pessoas, está mergulhada na história humana e, portanto, será melhor compreendida à medida em que sua história é desvelada: cristo encarnado e igreja encarnada fazem parte da história e, por isso passíveis de estudo.

A História da Igreja no Contexto da Teologia

Após contrapor as posições de Bauer e Harnack de um lado e Karl Barth de outro, o autor apresenta sua posição sobre o questionamento a respeito da necessidade da História da Igreja para a Teologia. O ponto é semelhante ao anterior, advogando o texto que se Deus participa da história humana, dentro das limitações que ela tem, a compreensão histórica de sua encarnação é indispensável para a jornada em busca de conhecê-lo.

O ponto é que Deus, ao invadir a dimensão tempo e espaço, fez história, tornando indissociável a conexão teologia e história da igreja.

O Objetivo da História da Igreja

Depois de destacar os pontos de vista de Gerhard Ebeling (compreensão das Escrituras), Heinrich Bornkamm (o evangelho e seus efeitos no mundo) e Kurt Schmidt (Cristo e seu permanente agir no mundo), o autor apresenta como objetivo da História da Igreja ler a trajetória humana a partir do próprio Deus, integrando em um mesmo cenário histórico as ações humanas e as intervenções divinas.

História e sua Atualidade na Teologia

O texto aponta o iluminismo como marco a partir do qual a igreja passou a ser considerada como objeto histórico. Isso aconteceu, a despeito das muitas resistências, pela superação da dicotomia entre história profana e história metafísica. Considerações importantes do autor a partir de Alberigo e Wirth reforçam a inexistência de uma igreja fora do tempo e do espaço, a necessidade de rigor científico na abordagem histórica da igreja, a libertação do conceito de igreja do jugo da hierarquia institucional e uma teologia histórica a partir da fé rumo à libertação.

Conclui o autor ressaltando a história como disciplina ao mesmo tempo transformadora, uma vez que impulsione “a reflexão sobre a dignidade e valores da vida” e em transformação, uma vez que disposta a indagar o passado, alterá-lo conforme a verdade e assim refazer-se no presente para construir um novo futuro.

Uma História Religiosa ou não religiosa da Igreja?

O autor aborda de forma rápida a questão afirmando que não a história não ser correta ou legítima a depender do ponto de partida (motivação ou interesse do historiador). No entanto ressalta a necessidade de que seja científica em sua metodologia. O texto evoca uma cooperação entre historiadores crentes ou não.

Ressalte-se que ao tentar exemplificar a cooperação, o autor não foi muito claro quanto à contribuição do “cientista crente”.

Novos Paradigmas para a História da Igreja

Refletindo sobre a historiografia da Igreja na América Latina, o autor apresenta três questões básicas a serem consideradas: primeiro o zelo por uma história realmente ecumênica, depois uma necessária consideração produção que leve em conta o destinatário da história e por último a necessidade de uma historiografia que articule a prática da comunidade cristã.

Problemas para uma periodização da história da igreja na América Latina

Considera o texto que apesar de a história acontecer de forma contínua, para estudá-la faz-se necessário marcar limites e indicar etapas mediante a adoção de determinados critérios. A questão que se coloca, então, é qual deve ser o ponto de partida desses critérios: acontecimentos intra-eclesiásticos ou extra-eclesiais. O ponto de vista do autor é claro ao afirmar que os extra-eclesias acabam sobrepondo-se e que “não se deve imaginar uma periodização ‘puramente eclesiástica’”.

A CEHILA propôs em 1973 que a história da igreja na América Latina fosse tripartite quanto às épocas (1492-1808, 1808-1930 e 1930- ), que estariam divididas em oito períodos; Enrique Dussel (1984) apresentou outra proposta também tripartite, mas com alterações no corte e no critério: para as épocas foram usados fatores de ordem econômica enquanto que para os períodos a referência foi sócio-política.

Enrique Dussel, Eduardo Hoornaert e Alberto Methol Ferré apresentaram periodizações tripartites, embora tenham usado diferentes critérios. O autor destaca a crítica de Prien que se aplica aos três esquemas: não há referência ao antes da chegada dos europeus, o foco é quase exclusivamente no desenvolvimento da Igreja Católica e a leitura quanto à ruptura ao final da época colonial é tardia e deve ser localizada no Iluminismo.

Prien propôs, então, a seguinte periodização: 1. As bases étnicas, culturais e religiosas da AL; 2. O desenvolvimento do cristianismo latino-americano sob o signo do modelo da cristandade; 3. A crise da cristandade latino-americana na época do iluminismo e emancipação política; 4. Igreja e sociedade entre restauração e secularização; e 5. O cristianismo na época do ecumenismo e da crise dos estados oligárquicos nacionais no conflito do desenvolvimento.

23 junho 2012

Teologia e pedagogia - sob a ótica da graça e cruz


Síntese do texto "Teologia e pedagogia - sob a ótica da “graça e cruz”: desafios para uma pastoral", escrito por Manfredo Carlos Wachs. Produzido dentro dos limites de forma exigidos pela EST - Escola Superior de Teologia como requisito da disciplina Relação Teologia e Pedagogia.

Introdução
De início o autor rejeita o mero contato entre teologia e pedagogia e sugere o estabelecimento de um espaço de influência mútua em prol de uma reconstrução. Apela para Sinner, Zabatiero, Mueller e Amélia Franco para definir teo-pedagogizar como o exercício de teorizar e concretizar uma práxis educativa que fale de Deus.

Dimensão interdisciplinar

O autor recorre à história para advogar a tese de que aquilo que hoje consideramos interdisciplinaridade fazia parte natural da forma de pensar anterior à fragmentação do conhecimento, ocorrida durante a modernidade. Por isso, veem-se nos escritos de antigos teólogos a teologia e a pedagogia a fazer parte de uma só reflexão. Afirma, no entanto, que mesmo depois da fragmentação é possível identificar pensadores resistentes a ela e favoráveis à unidade do pensamento humano e destaca Comenius como um representante desse pensamento. Comenius é contraposto a Descartes, apontando-se que a história optou pelo segundo e não pelo primeiro.

Em busca de fundamentar o tópico, o texto apresenta Fraas, Browning, Freire e Gutiérrez como teólogos e pedagogos partindo de um chão comum para desenvolver suas ideias: Fraas liga a fé aos fenômenos da vida e Browning propõe a correlação entre as questões sobre a experiência cotidiana e o testemunho cristão; Freire e Gutiérrez fazem algo parecido, ambos estabelecem uma hermenêutica “a partir de alguém e não para alguém” e assim teorizam começando por um contexto histórico localizado. Defende o autor, então, com vistas à teo-pedagogia, o “pensar em conjunto” ao invés de “buscar consensos”.

Com base no conceito freireano da incompletude, o autor desafia a teologia a revestir-se de humildade e respeito em seu processo de ensino, haja vista as limitações inerentes à compreensão e interpretação da verdade. A isso, junta o autor, encorajamento para compreensão da jornada de fé como um processo de aprendizagem que não está restrito e nem encontra seu ápice nos espaços e programas religiosos.

Desafios de uma teologia luterana no diálogo de uma teo-pedagogia

De forma a tornar prática sua proposta, o autor parte de certas dimensões teológicas e tenta pensar pedagogicamente sobre essas abordagens.

Assim, a encarnação e a vivência infantil de Jesus (que confrontaram o pensamento greco-romano sobre o valor das crianças), podem conduzir ao compromisso de agir em prol da inclusão de todas as crianças em um processo educacional redentor; a justificação por graça e fé (que confronta a justiça própria e autossuficiência), pode motivar à gratidão pelos recursos e auxílios recebidos na caminhada de estudo.

A dimensão da cruz (que transforma morte em vida em inequívoca e incondicional manifestação do amor de Deus em favor da humanidade) aponta para o acolhimento de todas as pessoas no contexto do processo de ensino-aprendizagem, no qual deixam de existir restrições quanto ao potencial de resposta e passa a vigorar a aceitação e respeito em decorrência do amor já revelado por Deus.

A gratuidade da redenção oferecida por Cristo (que confronta o pensamento humano baseado em mérito/merecimento) desafia a estabelecer no contexto das iniciativas e atividades pastorais relacionamentos generosos que não retém o que podem fazer em prol das pessoas nem manipulam estabelecendo moedas de troca ou permuta de favores.

Contribuição da hermenêutica ricoeuriana

Duas abordagens apresentada por Paul Ricoeur em sua hermenêutica são destacadas pela contribuição que podem oferecer ao pensar teo-pedagógico: os símbolos e a prospecção.

Afirma o autor que, segundo Ricoeur, é na multiplicidade dos símbolos que encontramos a plena revelação de Deus. De per si, cada símbolo revela e esconde, assim ao observar os diversos símbolos pode-se apreender mais que se concentrando em apenas um: não apenas a cruz, mas também a manjedoura, o vale dos leprosos e a sombra da. Pensa o autor que isso deve nos levar a incorporar à prática educacional o entendimento de que Deus não está preso aos limites religiosas que nós estabelecemos e que por isso as pessoas devem ser ajudadas dentro das fronteiras religiosas em que se encontram.

O texto continua apresentando o “olhar para o futuro” (prospecção em Ricoeur) como chave interpretativa da realidade. Ao invés de olhar saudosamente para o passado ou para dentro de si, entende o autor que Ricoeur nos desafia olhar para as utopias como dignas de serem buscadas. No entanto, o autor utiliza um parágrafo extenso para ressalvar a importância de um olhar retrospectivo sobre a cruz de Cisto, inclusive como fato histórico, e sua necessidade para questionar quem somos, o que fazemos, qual nossa contribuição e assim (re)significar o futuro. Entende o autor que essa reflexão é útil a partir do desafio de produzir indagações que questionem o futuro da prática educativa à luz de sua história e de sua efetiva contribuição para a transformação da realidade.

Uma contribuição da pedagogia freireana

Finaliza o autor os desafios a uma pastoral apresentando duas categorias do pensamento de Paulo Freire: Dialogicidade e a Tríade antropológica.

Freire compreende o diálogo como pertinente à diversidade, mas não ao antagonismo. Para ele não se trata de uma técnica, mas uma atitude de vida pautada no entendimento de todos são detentores de saberes. Esse diálogo, portanto, desafia nossas próprias verdades e valoriza o relacionamento entre os diferentes. Pensa o autor que essa contribuição de Freire favorece ao diálogo inter-religioso, bem como leva ao entendimento de que há saberes a serem aprendidos em outras comunidades religiosas, nas tradições populares e junto às lideranças locais. A disposição para ouvir será recompensada com a disposição do outro de ouvi-lo. Quanto à tríade antropológica (fé, esperança e amor), entende o autor que deve permear toda a prática educativa no contexto das pastorais, ao nos deixarmos contaminar pela esperança e amor do próprio Deus.

Educação e Transcendência


Síntese do texto "Educação e transcendência: dimensões contempláveis, aspectos edificáveis e categorias compartilháveis", escrito por Marlon Leandro Schock. Produzido dentro dos limites de forma exigidos pela EST - Escola Superior de Teologia como requisito da disciplina Relação Teologia e Pedagogia.


No texto, a proposta de relacionar e identificar as intercessões entre educação e transcendência está circunscrita ao contexto das “dimensões contempláveis, aspectos edificáveis e categorias compartilháveis”. O autor define dimensões contempláveis contrapondo-as à noção de numinoso em Rudolf Otto. Desta forma, as relaciona aos aspectos racionalizáveis da transcendência. Afirma ainda que essas dimensões mantêm ligações com o sensitivo, mas sem abstrair o cognitivo, uma vez que uma dimensão não exclui a outra e juntas com a volição são elementos constitutivos do ser humano, separáveis apenas didaticamente.

Entende o autor que a relação entre transcendência e educação pode ser melhor articulada por um viés antropológico (considerando a ação do homem sobre o homem e seu meio ambiente), em contraposição ao entendimento de Otto que sugere a Revelação. O texto apresenta o sentimento numinoso como pano de fundo da sugestão de Otto na qual a dependência do divino é o principal dificultador para entrelaçar transcendência e educação. Encerra esse argumento dizendo que apenas partindo das dimensões contempláveis seria possível falar de aspectos edificáveis e categorias compartilháveis.

Reconhecendo não ser possível educar a transcendência, mas para a transcendência, o autor passa a listar o que considera os eventos destacáveis que impulsionam o ser humano a transcender: desejo e vocação para o ser mais; criticidade e conscientização; utopia crítica e esperança; relacionamento e afetividade.

I – Educar o desejo e vocação para o ser mais

O autor se propõe a primeiro refletir sobre a natureza humana e assim estabelecer uma base para sua reflexão sobre educação. A partir do pensamento de Paulo Freire sobre a incompletude humana e de Rahner sobre as indagações permanentes de um ser humano inconcluso, compreende-se que o mesmo fator que induz à transcendência é também o “núcleo fundamental do processo de educação”. Assim, a vocação humana para ser mais está apoiada em nossa necessidade de compreendermos a nós mesmos e a realidade que nos cerca – conscientização.

Afirma o autor que, no contexto de um processo de conscientização, a inquietude humana coloca-nos diante de questões que mesmo respondidas, produzem mais desconforto e impulsiona à transcendência em alguma direção. Caberia à educação o papel de canalixar esta força entre reflexão crítica e ação esperançosa. Advoga o autor, com base no pensamento de Paulo Freire, que a práxis educativa deve ser ao mesmo tempo profética (crítica) e esperançosa.

A educação para o ser mais é aquela que cria condições para transcender a realidade quando esta resultar em desumanização. Como seres condicionados, mas não determinados, somos reconhecidos como educáveis, jamais adestráveis. Assim, o ser humano capaz de libertar-se da realidade opressiva que o aprisiona é semelhante à aquele que é liberto do instinto e dos determinismo biológicos, e também transcende.

O caráter ontológico da incompletude humana não pode ser negado. Essa poderosa força do homem não saciado de si mesmo, que provoca a dor não ser completo o desejo de ser mais pode e deve ser educada para a transcendência e transcender pela educação.

II – Educar para a utopia crítica e esperançosa

Sonhar com um futuro melhor é ter esperança. Essa é uma capacidade intrinsecamente humana e tem se tornado indispensável à existência em nossos dias. Para o autor, no pensamento de Paulo Freire, esperança não é esperar, mas agir em direção à utopia desejada e sonhada criticamente.

Pontua o texto que esperança é o passo seguinte de uma incompletude que se tornou consciente, portanto tem o mesmo fundamento da educabilidade do ser humano. Assim a educação é um “processo de busca fundamento na esperança”. No entanto, trata-se de uma esperança acompanhada de criticidade.

Resistente ao modo de pensar dos fatalistas, Freire insistia que esperança e utopia são necessárias à educação e que sem elas o processo educacional torna-se mera formação técnica à serviço das classes dominantes. Afirma o autor que segundo Freire a esperança deve ser mantida e ensinada a todo custo sob a pena de se instaurar um processo de desumanização. É preciso “desvelar as possibilidades”.

Assim educar para a utopia crítica e esperançosa conecta o sentido das coisas dentro de um projeto de vida, “significando” o que se estuda em um contexto de transcendência em busca de “um mundo mais justo, mais humano”, em busca de ser mais.

III – Educar para o relacionamento e a afetividade

Partindo da afirmação de Paulo Freire de que “Não há educação sem amor [...] Quem não e capaz de amar os seres inacabados não pode educar.”, e de sua história de vida, o a autor coloca o amor na base do processo educacional. O amor é a argamassa que mantém tudo unido e o alicerce dos relacionamentos. Defende ainda que o amor a que se referia Freire é o mesmo tipo de amor altruísta a que o outro Paulo se refere no capitulo 13 de I Coríntios, haja vista sua referência a amar serem inacabados, imperfeitos, inconclusos. Em seguida, pinça outra afirmação de Freire de que “Não há educação no medo” para reforçar a tese da referência indireta ao texto bíblico.

Em contraponto à transcendência cognitiva/volitiva, o autor apresenta uma transcendência emotiva/sensitiva, verificada a posteriori com resultado de “afetivadade, carinho, toque e palavra afável”. Advoga, então ser um desperdício não aproveitar o tempo de interação com o educando de forma a priorizar a afetividade mediante o estabelecimento de um ambiente onde seja possível expressar emoções sem que isso implique em enfraquecimento da capacidade intelectual, cognitiva, reflexiva, lógica.

Conclui o autor que os relacionamento são o limite até onde o ser humano poderá ir em meio à complexidade da sociedade em que vivemos, o que revela a importância de educar para o relacionamento e a afetividade.

18 junho 2012

O Paulo da Pedagogia


Síntese do texto " teológico e pedagógico em Paulo Freire: desafios à reflexão curricula" escrito por Manfredo Carlos Wachs. Produzido dentro dos limites de forma exigidos pela EST - Escola Superior de Teologia como requisito da disciplina Relação Teologia e Pedagogia.

A guisa de introdução, para posicionar seu ponto de partida e os objetivos do texto, o autor afirma que, embora teologia e pedagogia tenham experimentado referências comuns nos anos 1970, a instrumentalização dos princípios pedagógicos de Paulo Freire como mera ferramenta no contexto prático da educação cristã não tem contribuído para um diálogo interdisciplinar, mas esvaziado aqueles princípios de seus significados. 

Entende o autor que à luz da intercessão histórica, faz-se necessário encontrar uma intercessão também na teorização, sistematização e reflexão acadêmicas que leve teologia e pedagogia a cooperarem na feitura de um novo pensar. Isso seria alcançado pela escuta mútua entre teólogos e pedagogos, uma espécie de semeadura de um novo processo de construção do conhecimento.

Pressupõe o autor que a reflexão pedagógica deve ter qualidade teológica da mesma forma que a reflexão teológica deve primar pela boa pedagogia. Assim, indaga o autor sobre “o quanto de teológico está incorporado na pedagogia de Paulo Freire”, e o faz em dois momentos: primeiro refletindo sobre o ponto vista dos teólogos a respeito da obra de Freire e em seguida sobre a qualidade da teologia ali presente.

I – Análise Crítica

Quanto à análise crítica, o texto apresenta-se de forma resumida e, quiçá, rasa. De um lado são apresentadas as críticas de Matthias Preiswerk, Dom Vicente Scherer e John Elias; do outro lado são listados pontos de defesa trabalhados por Nestor Beck, Carlos Alberto Torres Novoa e Herman Brandt.

Preiswerk vê Freire como uma síntese que mescla humanismo católico, nacionalismo e traços do marxismo. Já Sherer é categórico em afirmar que o pensamento de Freire e a doutrina cristã são irreconciliáveis e Elias vê excesso de otimismo nas ideias de Paulo Freire, pois não acredita que o homem pecador seja capaz de transformar sua realidade.

Na outra margem, Beck encontra na pedagogia de Freire elementos práticos da liberdade cristã e uma correlação entre ambas quanto ao ambiente comunitário em que nascem e sobrevivem. Novoa evoca a importância da mescla entre a educação e a teologia que visam à liberdade. Brandt advoga que Freire concede à libertação uma qualidade religiosa e afirma que ele articulou sua pedagogia a partir do a priori da fé no ser humano. Novoa complementa o entendimento ao afirmar que em Freire não é caso de haver apenas linguagem ou metáforas religiosas, mas de teologização.

II – Qualidade Teológica

No texto, o autor escolheu dois aspectos do pensamento pedagógico de Freire para refletir sobre a qualidade da teologia ali presente: a questão do a priori e o poder da palavra.

Entende o autor que ao apresentar a fé no ser humano como pressuposto para o diálogo entre pessoas e grupos, Freire reconhece que a convicção na capacidade do ser humano de “fazer e refazer, criar e recriar” não trata de afirmar a existência de habilidades, atributos ou conhecimentos, mas tem ares de “graça concedida” e, portanto, se encontra dentro da dimensão da graça divina, do tipo que fala Jesus no Sermão do monte ao afirmar que Deus “faz nascer o sol tanto sobre bons como maus”.

Freire compreende Deus como aquele que sabe de forma absoluta e o ser humano como quem se encontra em permanente processo de aprendizagem. Assim, da mesma maneira que Deus está presente na história da libertação humana, o ser humano se faz presente à medida que liberta e é libertado em seu processo de aprendizado. O ser humano, então, é co-autor da Criação e co-participante da obra de Deus ao “criar e recriar formas de relacionamento com toda a criação”.

Nessa perspectiva, a fé no ser humano fala do amor às pessoas e o amor está se sustenta na esperança da transformação. Estabelecida esta “tríade antropológica” do pensamento pedagógico de Paulo Freire, não se pode fugir da tríade bíblica apresentada pelo outro Paulo; o teólogo hierarquiza e o pedagogo entrelaça, mas os entendimentos se tocam e são compartilhados.

O amor que está presente no diálogo se vê na humildade de ouvir a leitura que o outro tem do mundo, inclui a confiança mútua na ação libertadora do aprendizado e a esperança de transformação da realidade pela vivência dos sinais do Reino como justiça e igualdade. Ao mergulhar na realidade experimentada pelas pessoas e emergir com elas para uma nova realidade depois de sofrer junto o sofrimento que agora é conjunto, fica clara a perspectiva cristológica que permeia o cerne da pedagogia freireana.

Outro aspecto abordado no texto é o poder da palavra, que no pensamento de Freire “forte conexão teológica”. Usada ao mesmo tempo para sintetizar o binômio ação-reflexão e expressar a leitura de mundo e dos processos de transformação, a palavra em Freire é um ato criador do “Ser-Mais”. Assim, se estabelece uma ligação com a concepção bíblica da palavra geradora de vida como apresentada no Gênesis.

Para Freire o evangelho é um palavra libertadora construída por Cristo em meio ao relacionamento dele com o mundo e as pessoas em sua volta e Jesus é o pedagogo que vai fazendo surgir essa “palavração” a partir da realidade da pessoas com quem convive pelas parábolas, pelos milagres e por sua paixão e morte.

A antropologia freireana compreende o ser humano como inacabado, incompleto e, portanto, sujeito à experiência do aprendizado. Cientes desta condição os atores do processo ensino-aprendizagem podem revestir-se de humildade e respeito por si e pelos outros, bem como abertos à valorização da leitura que o outro tem da realidade. Por outro lado, pode-se destacar o entendimento de Paulo Freire sobre o processo de ensino-aprendizagem como “uma relação de comunhão entre pessoas pensantes”. Isso remete ao ambiente comunitário seu entendimento pedagógico e o relaciona à salvação que é nossa, e não minha.