Por Aristarco Coelho
Há palavras que parecem causar calafrios quando se ouvem. Compromisso é uma delas.
Comprometer-se é assumir responsabilidade. Por isso a palavra é falada e ouvida com bastante cuidado. É tal o peso que leva consigo, que muitos utilizam a expressão “sem compromisso” para tentar transmitir a idéia de liberdade.
No entanto, a despeito do ônus que alguns vêem no conceito (e na prática) de compromisso, por milênios as relações humanas foram construídas sobre esse chão. Em simples acordos pessoais de convivência ou nos grandes empreendimentos envolvendo nações inteiras, a história da humanidade não teria acontecido sem que compromissos fossem firmados e mantidos.
Hoje vivemos uma notória crise de compromissos nas mais diversas esferas do relacionamento humano. Amizades são rompidas e se desfazem por muito pouco. Basta que uma das partes se sinta prejudicada no relacionamento para que a idéia de descartar o outro venha à mente. Pessoas como latas de alumínio e caixas de papelão. Não é nada fácil encontrar amigos que assumam o compromisso de caminhar juntos pela vida, e uma raridade amizades disposta a enfrentar as horas boas e também as ruins.
Assim como a amizade, o casamento sofre imensamente com a crise de compromisso. O egoísmo e o imediatismo do mundo de consumo nos centros urbanos não deixa oportunidade para o casamento amadurecer; pensar primeira e quase exclusivamente em si mesmo parece ser a regra que orienta boa parte das pessoas nos relacionamentos atuais. Diante disso, os compromissos tornam-se volúveis e ancorados em si mesmos.
Outro relacionamento que tem sido abalado com a crise de compromisso em que vivemos é a ligação entre pais e filhos. Nos noticiários e na vizinhança, pais odeiam filhos, filhos matam pais, mães jogam filhos no lixo, nem o sangue do mesmo sangue parece inspirar compromisso.
Na política, o compromisso tem muitas faces e muitos tempos. Interpretar essas faces e tempos é algo difícil para o cidadão comum. A política reserva para a palavra significados dúbios e não verificáveis. Assim, o compromisso com a coletividade, que já foi marca registrada de muitos homens públicos, hoje jaz moribundo nas sarjetas dos congressos, câmaras e assembléias.
A Igreja também é vítima dessa crise de compromisso. Fiéis, não muito fiéis, flutuam entre os agrupamentos religioso ao sabor dos serviços que lhes são oferecidos por cada igreja. Com quem se pode contar para construir o futuro da Noiva de Cristo? Não se sabe! Os rostos diferentes se repetem a cada reunião.
Mas, antes que uma precipitação nos leve a concluir que o compromisso está em extinção, é preciso olhar a questão por outro lado. A crise de compromisso não está na ausência da atitude de lealdade, mas na mudança do foco e das bases do compromisso.
Quando alguém assume um compromisso, pode estar focado em si mesmo ou na outra parte. Embora essa não seja uma questão de "ou", mas de "e", a ênfase do foco faz toda a diferença. O ponto crítico é porque compromissos são acordos mútuos, mas cumpridos pessoalmente, isto é, você só pode responder pela sua parte. Apenas o que lhe cabe no acordo está sob algum controle, e isso representa um grande risco.
Quando firmamos compromissos com foco nos benefícios a ganhar, além de expor-nos ao risco da frustração, colocamos a insegurança do cumprimento para o centro da questão; Mas quando o foco do compromisso é nossa disposição em mantê-lo, ainda que com prejuízo próprio mas em benefício do outro, a tensão e as expectativas de "lucrar" com o outro ficam em segundo plano.
Mas porque alguém tentaria manter um compromisso com prejuízo próprio? Isso não faz muito sentido para a mentalidade mercantilista em que vivemos. Prejuízos, financeiros, emocionais, ou morais, são inadimissíveis. Na verdade, parece que só é razoável fazer isso em nome de algo maior que o prejuízo assumido, isto é, é preciso que as bases do compromisso sejam largas e solidamente fundadas para suportar os possível prejuízos do caminho.
Crenças, valores e princípios são as bases capazes de suportar compromisso duradouros. É olhando para eles que os compromissos podem ser mantidos, ainda que unilateralmente. Foi a crença no amor do Pai, a confiança de que os valores do Reino resultam em recompensa maior e a fidelidade aos princípios pelos quais Deus age, que permitiram a Jesus manter seu compromisso até o fim.
Amizades duram anos quando o foco é o bem que posso fazer pelo outro e a base é o amor fraternal que me faz sentir a dor do outro como minha; casamentos se tornam duradouros quando as necessidades do outro são prioridade em minha lista e a base é a Graça de Deus, que ama sem esperar qualquer prêmio ou reconhecimento; pais e filhos constroem juntos quando o foco é crescimento do outro e a base é o respeito por sua individualidade; a política se torna benefício quando o foco é o bem comum e a base é o valor inestimável da vida humana; a Igreja é viva quando o foco é a implantação do Reino pregado por Jesus e a base é submissão ao Espírito de Deus.
Manter compromissos não é fácil. Foco certo e bases que realmente valham a pena fazem toda a diferença, mas não são suficientes. Apenas quando reconhecermos nossas limitações e abrirmos nossas vidas para a ação sobrenatural de Deus através do seu Espírito é que podemos esperar algum resultado acima da mediocridade que assola os compromissos em nosso país. Que Deus nos dê a Graça de ser parecidos com Jesus, que assumiu seus compromissos até a morte, e morte de cruz.
Nenhum comentário:
Postar um comentário