13 junho 2016

As Faces Escuras do Arrependimento



As Faces Escuras do Arrependimento

Introdução

Hoje vamos refletir juntos, e com a ajuda do Espírito Santo de Deus, sobre o arrependimento e suas implicações no processo de santificação dos discípulos de Jesus.

Eu espero que você permaneça atento e acompanhe comigo esse maravilhoso e importante ensino das Escrituras, para assim colhermos frutos preciosos em nossas vidas, na vida de nossas famílias e na vida de nossa igreja.

Bom, a abordagem mais comum sobre arrependimento é sobre o papel que ele tem naquilo que costumamos chamar genericamente de conversão (ou aceitar a Jesus, ou se entregar a Jesus). Em outra oportunidade poderemos tratar com detalhes sobre esse aspecto. Hoje, no entanto, nosso assunto é a relação entre arrependimento e santificação.

Arrependimento e Salvação

É inegável que arrependimento está fora de moda. Ninguém mais deseja se arrepender. O que ouvimos o tempo todo é que devemos viver a vida de forma intensa, fazendo tudo que tivermos vontade, para depois não lamentarmos por não ter curtido tudo que a vida tem para oferecer. Arrependimento parece uma coisa triste e está definitivamente fora de moda.

Hoje, quando alguma tristeza ronda nossas mentes, talvez por coisas que nos tiram a paz e incomodam a consciência, rapidamente muitas vozes se levantam (no Face, no Whatsapp, no Twitter ou ao vivo mesmo) para dizer que não devemos dar espaço para esses sentimentos negativos, e que arrependimento a gente só deve ter pelas coisas que não fez; o resto faz parte da vida. Será que esse ensino facebokiano está de acordo com as Escrituras?

Se olharmos com atenção para as Escrituras e para a história da Igreja, veremos que, na verdade, o arrependimento é uma disciplina espiritual importante; tão importante que nenhum cristão tem o direito de desconhecer os seus elementos e as armadilhas, as mentiras e os equívocos que cercam esse assunto.

Penso que nosso olhar sobre o arrependimento, atualmente, é, de certa forma, simplista. Não sabemos muito bem o que ele significa nem como ele pode acontecer. Sabemos que as pessoas devem se arrepender para serem salvas, mas nossa compreensão sobre arrependimento e nossa experimentação pessoal é quase sempre limitada.

Thomas Watson, um pregador e pastor inglês do século XVII, escrevendo sobre arrependimento, identificou ao menos seis diferentes fases desse processo. Segundo ele, para que um verdadeiro arrependimento aconteça, é necessário:

Percepção do pecado
Tristeza pelo pecado
Confissão de pecado
Vergonha pelo pecado
Ódio pelo pecado
Converter-se do pecado

D. L. Moody, um dos maiores evangelistas norte-americanos do século XIX, em uma de suas pregações, escreveu o que poderia ser chamado de 5Cs do arrependimento:

Convicção de pecado
Contrição pelo pecado
Confissão de pecado
Conversão do pecado
Confissão de Cristo

A verdade é que há muito a aprender sobre arrependimento a fim de não nos tornamos evangelistas rasos. O desconhecimento da natureza humana e da própria pecaminosidade muitas vezes nos torna incapazes de desafiar as pessoas a mudarem o rumo de suas vidas.

Quem não experimentou arrependimentos verdadeiros em sua própria vida dificilmente será capaz de desafia outras pessoas ao verdadeiro arrependimento.

Arrependimento e santificação

É possível que algumas pessoas só consigam ver o arrependimento como algo que acontece àquele que não é cristão, para que a pessoa seja salva. Mas essa é uma visão limitada do que é arrepender-se. O arrependimento está ligado diretamente ao amadurecimento do discípulo de Cristo. Arrependimento e discipulado devem andar sempre lado a lado.

O profeta Isaías registrou uma afirmação que Deus fez sobre arrependimento que deve chamar nossa atenção para o fato de que arrependimento é parte da caminhada de todos aqueles que seguem o Senhor.

“No arrependimento e no descanso está a salvação de vocês, na quietude e na confiança está o seu vigor, mas vocês não quiseram.” (Is 30;15)

Para quem o profeta Isaías escreveu esse recado do Senhor? Teria sido para nações incrédulas, um povo que não temia ao Senhor? Não! Isaías estava falando com o povo de Deus. Lendo o começo desse capítulo, é possível constatar isso, pois o Senhor se dirige para seus...

 “filhos obstinados... que executam planos que não são os meus, fazem acordo sem minha aprovação, acumulando pecado sobre pecado.” (Is 30.1)

Um outro profeta, chamado João Batista, começou o seu ministério com um apelo ao arrependimento:

“Arrependam-se, porque o Reino dos Céus está próximo.” Mt. 3.2

Com quem João Batista estava falando? Seria com os romanos? Não! Ele estava se dirigindo ao povo de Deus, que temia ao Senhor. Um povo que conhecia as profecias e aguardava a vinda do messias prometido.

D. L. Moody, falando sobre o arrependimento disse o seguinte:

“Eu tenho me arrependido dez mil vezes mais depois que conheci a Cristo, do que em qualquer época anterior, e penso que a maioria dos Cristãos precisa se arrepender de alguma coisa.”

A conclusão a que podemos chegar, então, é que o arrependimento deve fazer parte da vida do povo de Deus como uma prática cotidiana; assim como o pecado é cotidiano.

Por isso, precisamos sondar nossas almas e descobrir as reais razões de nos sentirmos arrependidos e, no caso de descobrirmos algum autoengano ou entendimento equivocado das Escrituras, que o Senhor nos ajude hoje a corrigi-los e assim recuperar toda a importância do arrependimento para nossa caminhada com Cristo.

23 Examina-me, ó Deus, observa o meu íntimo. Prova-me e analisa-me os pensamentos. 24 Vê tudo o que haja em mim de mau, e conduz-me pelo caminho eterno! Sl 139. 23,24

As Faces Escuras do Arrependimento

Tim Keller, pastor e escritor norte-americano, escreveu um texto, traduzido por Felipe Sabino de Araújo Neto e publicado no site monergismo.com, que pode nos ajudar a descobrir o papel e a importância do arrependimento no progresso da vida cristã.

Ele nos relembra que o arrependimento não é uma exclusividade daqueles que seguem a Jesus. Entre aqueles que simplesmente praticam uma religião também ocorrem arrependimentos. A diferença está no propósito, no objetivo que se tem ao arrepender-se.

Keller explica que para os religiosos o arrependimento é basicamente um meio de “manter Deus feliz”, de forma que Ele continue te abençoando e respondendo suas orações. Já para os seguidores de Jesus, que abraçaram o seu evangelho e foram definitivamente salvos por ele, o arrependimento tem como propósito manter viva a alegria do nosso relacionamento com Ele.

Esse arrependimento religioso é uma tentação que sempre nos rodeia. Precisamos rejeitá-lo, porque esse tipo de arrependimento é egoísta, promotor de justiça própria e amargo (até o fim).

UMA NOTA: religioso é aquele que faz aquilo que é certo, mas pelas razões errada. Religioso é aquele que ser esforça para viver uma vida correta, porque pensa que assim vai acumular créditos com Deus, e ganhará o direito de pedir o que quiser para ele. Vejamos um desses religiosos em ação na história contada por Jesus no evangelho de Lucas 18.9-12.

9 ​E disse também a uns, que tinham confiança de si mesmos que eram justos, e desprezavam aos outros, esta parábola: 10 ​Dois homens subiram ao Templo para orar, um fariseu, e o outro cobrador de impostos. 11 ​O fariseu, estando de pé, orava consigo desta maneira: Ó Deus, eu te agradeço, porque não sou como os outros homens, ladrões, injustos e adúlteros; nem [sou] como este cobrador de impostos. 12 ​Jejuo duas vezes por semana, [e] dou dízimo de tudo quanto possuo. Lc 18.9-12 [BL]

Com olhos atentos a esta história, vamos refletir sobre algumas faces escuras do arrependimento, quando ele é praticado por motivos religiosos, como no caso desse fariseu.

Egoísmo

Uma das faces escuras desse arrependimento religioso é o egoísmo. Preocupado apenas consigo mesmo, fica-se triste não pelo pecado em si, mas por causa do medo que se tem de sofre alguma consequência, de ser punido, de perder alguma bênção ou coisas do gênero.

Quem se arrepende apenas para deixar Deus feliz, para não perder o favor de Deus, acaba falando mais sobre si mesmo que sobre a graça de Deus; pensa mais em se dar bem que em agradecer pelo cuidado de Deus; está mais preocupado na sua imagem diante de Deus e das pessoas que na visão de um Deus maravilhoso que o amou.

Veja que o fariseu, embora comece com uma palavra de gratidão, estava tão focalizado em si que ao orar só conseguiu falar de si e de suas pretensas conquistas religiosas.

11 ​O fariseu, estando de pé, orava consigo desta maneira: Ó Deus, eu te agradeço, porque [eu] não sou como os outros homens, ladrões, injustos e adúlteros; [eu] nem [sou] como este cobrador de impostos. 12 [eu]Jejuo duas vezes por semana, [e] [eu] dou dízimo de tudo quanto possuo.

O que fazer se você se identificou com o fariseu da história, mais preocupado em livrar a própria pele? É possível que você ainda não tenha compreendido completamente o evangelho de Cristo.

Então, é preciso, de uma vez por todas, entender que o evangelho não é um meio para você se livrar do castigo de Deus. O evangelho é a boa notícia de que Deus o amou e deseja o seu bem, tanto nesta vida como na eternidade.

Deus não o amou porque você é uma boa pessoa. Ele o amou primeiro para tornar você a melhor pessoa que você puder ser, isto é, fazer de você alguém parecido com Jesus, de maneira que seu coração se encha de amor e gratidão a Ele.

18 Nós não precisamos ter nenhum receio de alguém que nos ama com perfeição; seu perfeito amor por nós afasta todo o temor daquilo que Ele poderia nos fazer. Se estamos com medo, é porque tememos aquilo que Ele poderia nos fazer, e isso mostra que não estamos completamente convencidos de que Ele realmente nos ama.19 Portanto, como se vê, o nosso amor por Ele vem como resultado de nos ter Ele amado primeiro. 1 Jo 4.18,19 (VIVA)

Justiça própria

Além do egoísmo, outra face escura desse arrependimento com motivações meramente religiosas é a justiça própria. Tim Keller alerta que, muito facilmente, o arrependimento pode se tornar uma espécie de tentativa de auto justificação.

É fácil ver isso na fala do fariseu. A oração dele é quase uma exposição de motivos pelo quais ele deve ser reconhecido por Deus e pelos outros como alguém digno, honesto e cumpridor de suas obrigações. Ele não precisa da graça de Deus. Ele mesmo já fez tudo.

Da mesma forma, algumas pessoas se arrependem, mudam de comportamento e até se tornam cidadãos de bem, porque acham que assim Deus vai aceita-los. Esse tipo de arrependimento é uma tentativa de primeiro zerar as contas com Deus, para não chegar até ele de mãos vazias. Não é esse o arrependimento de que fala o evangelho de Cristo.

Ao contrário disso, os seguidores de Jesus confiam mesmo é no amor gracioso de Deus, provado pela morte de Cristo e sabem que não são justos, mas celebram o fato de que foram justificados pelo sangue de Cristo.

4 Mas quando se manifestaram a bondade e o amor pelos homens da parte de Deus, nosso Salvador, 5 não por causa de atos de justiça por nós praticados, mas devido à sua misericórdia, ele nos salvou pelo lavar regenerador e renovador do Espírito Santo, 6 que ele derramou sobre nós generosamente, por meio de Jesus Cristo, nosso Salvador. 7 Ele o fez a fim de que, justificados por sua graça, nos tornemos seus herdeiros, tendo a esperança da vida eterna. Tt 3.4-7

Amargura

O arrependimento religioso, além de ser egoísta e buscar justiça própria, torna as pessoas inseguras e tensas, e como tempo amargas. Como isso acontece?

Quando alguém se esforça para ser uma boa pessoa, para agradar a Deus e ser aceito por ele, percebe logo que isso não é nada fácil. Na verdade, é impossível, porque o padrão de Deus é a perfeição.

Mas o religioso é do tipo que não desiste nunca. Então, a cada novo pecado que surge em sua vida ele se arrepende daquilo que fez e no fundo de sua alma afirma para si mesmo que essa foi a última vez.

Com o tempo, as sucessivas ocorrências de pecados/arrependimentos se tornam um desconforto e, por fim, um peso insustentável de tristeza e amargura.

Para quem pratica o arrependimento religioso, isto é, para quem muda de comportamento apenas como objetivo de ser aceito por Deus, cada ocorrência de pecado e arrependimento se torna traumática, anormal e ameaçadora para sua saúde espiritual.

Em parte, isso acontece porque é muito difícil para uma pessoa que vive à base de arrependimentos religiosos admitir que pecou, pois a esperança do religioso é um dia ser declarado por Deus uma pessoa de coração bom, talvez alguém que suplantou o pecado.

Mas o que dizem as Escrituras sobre isso? Vejamos na carta escrita pelo apóstolo do amor, João.

8 Se afirmarmos que estamos sem pecado, enganamo-nos a nós mesmos, e a verdade não está em nós. 9 Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para perdoar os nossos pecados e nos purificar de toda injustiça. 10 Se afirmarmos que não temos cometido pecado, fazemos de Deus um mentiroso, e a sua palavra não está em nós. 1 Jo 1.8-10

1 MEUS FILHINHOS, estou lhes dizendo isto a fim de que vocês fiquem longe do pecado. Mas se vocês pecarem, existe alguém para rogar por vocês diante do Pai. O nome dele é Jesus Cristo, Aquele que é tudo quanto é bom e que agrada completamente a Deus. 2 Ele foi quem levou sobre si a ira de Deus contra os nossos pecados, e nos trouxe à comunhão com Deus; e Ele é o perdão para os nossos pecados, e não somente os nossos, mas os do mundo inteiro. 1 Jo 2.1-2

Se a nossa esperança é nossa capacidade de fazer as coisas certas e sermos, por fim, considerados justos, admitir nossas fraquezas e deslizes pode ser um sofrimento atroz, um verdadeiro amargor.

Mas no evangelho nossa esperança está na justiça de Cristo e em seu amor por nós. Por isso, o arrependimento conforme o evangelho, não é dolorido nem penoso. Claro que sempre há tristeza pelo pecado cometido, mas o entendimento de que já fomos alcançados pela graça de Deus nos faz ficar alegres, por causa do perdão concedido por ele e pela oportunidade de corrigirmos nossos erros.

Conclusão

O arrependimento está no centro da dinâmica da vida cristã. Quanto mais maduros estamos em nossa fé, tanto mais facilmente nos arrependemos de nossos pecados.

O cristão amadurecido é aquele que já não tem ilusões sobre si mesmo; que conhece a maldade de seu próprio coração e sabe que nada adiante negar ou justificar os seus pecados.

O seguidor de Jesus que está crescendo em direção à estatura de varão perfeito, à imagem de Cristo, é aquele de coração quebrantado, que se arrepende fácil, que sem barreiras e com a frequência necessária reconhece seu pecado, se entristece por causa disso, confessa os pecados cometidos, se converte e, por fim confessa Cristo como a única esperança guardada em seu coração.


Que o Senhor mesmo nos ajude nessa jornada.

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