21 julho 2012

Como se vive relacionamento com Deus?


Parece-me que a ênfase expansionista tem-nos levado a um ativismo sem precedente em torno de mega-eventos e em honra a personalidades. Isso ocorre em detrimento da necessidade básica de nos ensinarmos mutuamente, através do exemplo, como se vive uma vida de comunhão e relacionamento com Deus.

Ora, se Deus não é uma realidade experiencial para os discípulos de quem se espera maturidade, o que podemos esperar de jovens e adolescente? Se homens e mulheres com décadas de caminhada cristã são incapazes de apresentar sua fé em uma conversar informal de um contexto pluralista, o que vamos cobrar de nosso jovens e adolescentes?

Acho que são aqueles a quem Deus concedeu dons e autoridade que devem tomar a iniciativa de conduzir as comunidades de fé das quais participam à maturidade; e isso inclui especialmente os jovens e adolescentes. Penso que esse é o pensamento de Paulo ao afirmar:

"Ele concedeu dons de apóstolo, profeta, evangelista e pastor-mestre para treinar os seguidores de Cristo, para que haja um serviço de qualidade no corpo de Cristo, a igreja. Ele fez isso para que todos possam trabalhar juntos em perfeita harmonia e sintonia, numa resposta cheia de gratidão e dedicação eficiente ao Filho de Deus, como adultos plenamente maduros, plenamente desenvolvidos, plenamente cheio de vida, como Cristo. Chega de ser criança. Não dá para tolerar gente ingênua, bebezinho que são alvos fáceis dos impostores. Deus quer que cresçamos, conheçamos toda a verdade e a proclamemos em amor - à semelhança de Cristo, em tudo." Ef. 4:11-15 AM

É necessário que uma mescla equilibrada de conhecimento sobre Deus e conhecimento de Deus faça parte de nossa tarefa pedagógica. Precisamos ensinar (e aprender) como andar com Deus, não apenas a fazer uma lista de coisas a respeito dele. E precisamos começar "ontem", porque o amadurecimento não tem pressa. Gente não amadurece como banana.

Texto extraído e editado a partir de minha participação no fórum de discussão realizado no contexto da disciplina "Pedagogia e Correntes Pedagógicas" tendo como assunto "Analfabetismo religioso e a mudança de imagem de Deus". Fórum realizado dentro do formato proposta pela EST - Escola Superior de Teologia.

19 julho 2012

Fé, família e igreja


Acho um risco colocar nos "lombos da igreja" uma responsabilidade que me parece ter sido delegada à família desde o tempos antigos da lei. É no contexto natural da vida, quando os dilemas e questionamentos de fé realmente surgem, que o ensino sobre quem é Deus e de como Ele se relaciona conosco toma corpo e pode ser experimentado por crianças, jovens e adolescente dentro dos limites da compreensão de cada um.

Um dos riscos que vejo quando despejamos a responsabilidade pela formação da vida de fé das crianças e adolescentes na "igreja" é a despersonalização dessa responsabilidade. Pais e mães, então, podem "descansar" porque a instituição igreja e seus programas educacionais darão conta do recado. Tenho visto muitas famílias fracassarem ao abdicar suas responsabilidades em favor da "igreja".

Outro risco que percebo é que, ao assumir a total responsabilidade quanto à educação religiosa de pais e filhos, a "igreja", através da atuação de seus líderes, pode produzir um processo de infantilização dos membros adultos da comunidade; pais e mães são esvaziados de seu inalienável papel pedagógico e se tornam meros coadjuvantes em um processo educacional que muito provavelmente será pautado pela dependência e submissão emocional aos líderes religiosos.

Por outro lado, acho que, como parte de uma comunidade de fé (E o que é um comunidade de fé, senão um agrupamento de famílias?) todos somos responsáveis uns pelos outros. Isso porque nossos exemplos de vida e a maneira como nos relacionamos com Deus e uns com os outros está efetivamente construindo os referenciais da vida de fé de nosso filhos.

A mim, parece-me razoável compreender a comunidade de fé como cooperadora com a família, mas nunca como responsável pela formação de fé de crianças e adolescentes. Se há uma responsabilidade pedagógica realmente a ser exercida no contexto do Corpo de Cristo, diz respeito à preparar-nos mutuamente para a autonomia e a liberdade em Cristo que advém de um relacionamento sadio com Deus.




Texto extraído e editado a partir de minha participação no fórum de discussão realizado no contexto da disciplina "Pedagogia e Correntes Pedagógicas" tendo como assunto "Vitimização e desigualdades são faces da mesma moeda". Fórum realizado dentro do formato proposta pela EST - Escola Superior de Teologia.

Inclusão e controle


Um aspecto que considero positivo é exatamente a clarificação da terrível estratégia de exclusão generalizada para assumir o controle do processo de inclusão. Transformar em situação padrão a não participação (exclusão) das pessoas no bem-estar que Deus, a partir dos recursos naturais, franqueou a todos e em seguida se apresentar como quem inclui os excluídos (é claro que conforme seus próprios critérios) é uma estratégia de controle e manutenção de poder; não se trata de situação restrita aos sistemas políticos e modos de produção.

A mesma situação acontece no contexto da igreja quando o sacerdócio universal do crente é apagado do ensino prático da igreja, o sacerdotalismo (católico e evangélico) é considerado como padrão, e, em seguida, os sacerdotes-pastores apresentam políticas de inclusão e participação dos leigos. Como assim "inclusão"? O véu do templo foi rasgado de cima abaixo? A exclusão não foi banida da cruz e essa coisa de clero/laicato não foi partida em pedaços no gólgota? No entanto, são considerados avançados e beneméritos os sacerdotes que incluem os leigos. E aqueles que trabalham em prol da inclusão 
são os visionários, mesmo reforçando o paradigma de controle e poder .

Essa mesma estratégia leva alguns servidores públicos a criarem dificuldade para vender facilidade. O cidadão tem direitos assegurados em lei mas os desconhece (ou insanamente não se importa com eles). Os direitos, então, são "apagados" da relação servidor-cidadão como forma de controle da situação e manutenção de poder. A partir daí o servidor público que "conceder" aqueles mesmo direitos passa a ser "o cara" (mesmo tendo ele extirpado o direito do cidadão, concedendo-o em conta-gotas conforme o seu próprio critério). Os espertos, então, são aqueles que conhecem a pessoa certa para fazer-lhes um favor (reforçando o falso paradigma de controle e poder).

De forma idêntica, se a Diaconia, no contexto da fé cristã, esquecer que seu trabalho é restabelecer o direito natural ao bem-estar (a despeito dos regimes e políticos e modos de produção) e transformar-se em mero benfeitor da estratégia sistêmica de manutenção de poder pela pseudoinclusão, estaremos tão somente reproduzindo o modelo deste mundo; isso sim é mundanismo.

Jesus alertou seus discípulos que começavam a disputar o poder no colégio apostólico dizendo que o modo de ver o outro que se tornou padrão neste mundo é o da dominação, mas que no Reino dele é diferente; a relação que tem valor é a do serviço mútuo, porque essa é coerente com o direito natural de bem-estar concedido ao ser humano e que estava na mente do criador.


Texto extraído e editado a partir de minha participação no fórum de discussão realizado no contexto da disciplina "Diaconia e Cuidado" tendo como assunto "A nova mentalidade do 'moderno colonizado' ". Fórum realizado dentro do formato proposta pela EST - Escola Superior de Teologia.

Diaconia: aprendendo com o passado


Síntese do texto "Diaconia e cuidado: testemunhos dos primeiros séculos do cristianismo" escrito por Rodolfo Gaede Neto. Produzido dentro dos limites de forma exigidos pela EST - Escola Superior de Teologia como requisito da disciplina Diaconia e Cuidado. 

A proposta do texto é apresentar diferentes formas de “solidariedade e amor ao próximo” presentes na vida da igreja durante os primeiros séculos de sua existência. A relação das diferentes expressões é ampla e inclui itens como o sepultamento, que dificilmente seria identificado como expressão de amor e solidariedade em nossos dias.

Ágape

As refeições comunitárias realizadas pela igreja, que incluíam a celebração da Ceia do Senhor, era um dos elementos importantes na vida da comunidade cristã. Nos Ágapes as pessoas levavam alimentos e outros bens para partilhar e assim suprir os mais necessitados. Além disso, as reuniões faziam parte da prática hospitaleira da igreja, que acolhia os irmãos em viagem (a expansão do evangelho com os apóstolos apoiou-se nisso). Os Ágapes, antes de serem separados da Ceia do Senhor, possuíam a virtude de incluir as dimensões social e mística do amor.

Socorro em epidemias

São muitos os registros históricos que dão conta do trabalho realizado pelos cristãos durante as epidemias que varreram o mundo antigo. Enquanto outros abandonavam os seus para morrerem, os cristãos cuidavam sem distinção de cristãos e não-cristãos. Muitos irmãos morreram ao se exporem no ampara aos infectados e cuidado dos moribundos. Vários líderes se destacaram na organização desta ajuda, mas foi o povo cristão que se entregou em sacrifício vivo para oferece um pouco de dignidade àqueles que sofriam com a peste.

Hospitalidade

Em comunidades nas quais praticamente inexistia um sistema de hotelaria, a hospitalidade era prática comum (e desejada) entre os cristãos. Sem esse acolhimento era certo que os viajantes em trânsito dormiriam ao relento, ralves sem comida e expostos ao frio. A hospitalidade entre os cristãos certamente tem como pano de fundo as orientações veterotestamentárias, mas se fortaleceu e consolidou a partir da decisão dos irmãos de abrir suas casas e torna-las em locais de encontro e convívio, verdadeiras igrejas caseiras.

Caixa comunitária

Entre os cristãos do primeiro século, a partilha de bens não era algo obrigatório, mas espontâneo. Aqueles que desejavam doavam o que bem lhes parecia para servir de suporte aos necessitados. As doações eram recolhidas à “caixa comum” da comunidade. Eram contribuições livres e costumavam ser modestas. Segundo Tertuliano, as doações eram usadas para alimentar os pobres, sepultar os indigentes, socorrer os órfãos e as viúvas, sustentar os escravos idosos e amparar os náufragos, além de ajudar os que sofriam nas minas, ilhas e prisões.

Coletas

O cuidado dos cristãos em cada comunidade nos primeiros séculos se estendia às necessidades das outras comunidades espalhadas pelo mundo. Foi assim que muitas vezes foram realizadas coletas para enviar recursos aos irmãos que passavam por necessidades em outras cidades. Essa expressão de amor e unidade encontra-se exemplificada no relato da campanha que Paulo realizou entre as comunidades da macedônia (de origem gentílica) para amenizar o sofrimento dos irmãos de Jerusalém (de origem judaica).

Sepultamento

A ausência de um sepultamento digno não era incomum no contexto experimentado pela igreja dos primeiros séculos e assim como hoje era tido como algo vergonhoso e lamentável, punitivo mesmo (como no caso dos romanos que negavam aos parentes os corpos dos mártires executados). Neste contexto, os cristãos muitas vezes entenderam como Missão prover os pobres e desvalidos de um pouco de dignidade depois de suas mortes. O entendimento de que o corpo do ser humano criado por Deus às sua imagem e semelhança merecia respeito mesmo depois da morte levou os cristãos a fazer algo a respeito. Havia comunidades inteiras comprometidas com isso, mas, sobretudo, individualmente era que cada cristão fazia o que estava ao seu alcance, havendo entre os mais abastados quem abrisse seus sepulcros particulares para abrigar o corpo daqueles que nada possuíam.

Posicionamento Pessoal

Considero o texto um belo resgate das práticas experimentadas pela igreja em seus anseios por seguir os passos de Cristo, imitando seu procedimento. É impressionante a variedade de oportunidades de serviço que a igreja encontrou em meio a contextos adversos, humilhantes e opressores, ratificando o entendimento de que bem-estar e individualismo conjugados raramente produzem pessoas capazes de atitudes de honradez e dignidade.

Dentre as várias questões poderiam ser destacadas, quero apontar para uma comparação entre a destinação prioritária dos recursos da igreja naqueles primeiros dias e a forma como ocorre hoje.

Vê-se claramente que a igreja de então, mesmo pobre e sem muitos recursos, decidiu que o pouco que tinha seria destinado prioritariamente a ajudar, socorrer, apoiar, suprir, alimentar e, de várias formas, restaurar a dignidade inerente ao ser humano criado por Deus. Não havia espaço na mente daqueles irmãos para copiar as estruturas religiosas ou a suntuosidade dos cultos pagãos existentes à época. Não havia o desejo de formar e sustentar uma casta sacerdotal ou de erigir monumentos arquitetônicos em homenagem à fé.

Aqueles irmãos encontraram as brechas (que eram muitas) deixadas pela sociedade quanto ao usufruto do bem-estar concedido por Deus e agiram em prol das pessoas em atitude amor e consideração. O cenário pode ser diferente, mas a situação é a mesma: a concentração de poder e de recursos naturais nas mãos de poucos priva os demais de experimentar a vida abundante desejada por Deus. O que faz a igreja? Alia-se ao sistema opressor e sai em busca do seu naco de bem-estar? Ou revoluciona a história e rompe o paradigma em loucas expressões de amor, respeito e dignidade? Há muito aprendizado necessário à igreja de nossos dias na mera leitura da história e dos exemplos daqueles irmãos.

Diaconia e Cuidado


Síntese do texto "Uma reflexão sobre o voluntariado" escrito por Márcia Paixão. Produzido dentro dos limites de forma exigidos pela EST - Escola Superior de Teologia como requisito da disciplina Diaconia e Cuidado

Referências históricas

Começando pelas confrarias do deserto (ativas 3 mil anos antes de Cristo) e terminando pelas associações voluntárias no Brasil do século XIX, a autora procura relacionar referências históricas do serviço voluntário.

A autora destaca que a partir da era cristã, sobretudo com a conversão do imperador romano Constantino, o serviço aos necessitados, que antes era visto como um ato de caridade ganhou uma conotação de prática religiosa. Essa institucionalização do serviço ao próximo, segundo a autora, caracterizou-se pela mera prestação de assistência, sem envolvimento com a história do sofrimento do outro.

Ressalta o texto ainda que as questões levantadas pelos reformistas na Idade Média em relação a diversas práticas eclesiais equivocadas vieram confrontar também os excessos cometidos pela Igreja em nome da caridade. Por esse tempo a igreja havia incorporado as obras de caridade e as ordens religiosas pregavam o serviço ao próximo e o desapego aos bens materiais. Com a reforma a prática da assistência ganhou novo significado com um retorno da participação leiga, recuperando este aspecto das confrarias do deserto.

No Brasil as associações voluntárias marcam presença em meados do século XIX, quando surgem também as organizações seculares de assistência.

A ação de Deus

A autora compreende que a diaconia (serviço) que liberta e promove autonomia é impulsionada pela encarnação de Deus em Jesus Cristo. Para socorrer a humanidade, Deus se fez gente e experimentou a condição humana. Essa é uma prova inconteste de seu amor. Da mesma forma somos desafiados a amar como Ele nos amou, isto é, devemos receber com gratidão o amor de Deus e partilhá-lo fazendo-nos iguais daqueles a quem pretendemos servir, respeitando sua alteridade e buscando o bem-estar e a justiça para todos.

Assim como Deus provou seu amor na encarnação, é no amor prático que os valores e a fé são demonstrados. Esse caminho remete ao aprendizado permanente, à conversão diária que encontra em Jesus o exemplo e desafio. Servir, então, é promover libertação e transformação no cotidiano da vida humana em seus mais diversos aspectos. Diferencia-se assim a diaconia motivada pelas boas notícias do amor de Deus demonstrado em Cristo do mero assistencialismo motivado pelo amor e bem-estar próprios.

O voluntariado e o bem-estar social

A autora procura estabelecer uma definição para bem-estar relacionando-o ao nível de acesso aos elementos básicos de sobrevivência, como moradia alimento, lazer, educação e trabalho, bem como ao exercício dos direitos civis. Em seu entendimento o bem-estar produz no ser humano uma relação de harmonia interna e relacional, uma vez que haja a percepção de igualdade com as demais pessoas em nossa volta.

Destaca em seguida que esse bem-estar não é experimentado por muitas pessoas, privadas de acesso àqueles elementos básicos de sobrevivência. Segundo afirma, essa privação impede que se experimente a vida plena desejada por Cristo para todos, mas pode ser amenizada pelo exercício do trabalho voluntário baseado no amor de Deus e comprometido em denunciar e transformar as estruturas que cerceiam a justiça e a dignidade humana.

Segundo a autora, o voluntariado com base no amor de Deus só será eficaz se houver coerência entre os valores de quem serve e as bases do evangelho de Cristo. Em outras palavras, é preciso que aquele que serve sonde suas próprias motivações e encontre em suas ações o desejo de libertação e transformação da pessoa servida e do ambiente limitador que a mantém privada do bem-estar. Não se trata de apenas sentir-se bem ajudando, mas de comprometer-se com o bem-estar do outro.

A diaconia do voluntariado

Neste tópico, a autora inicia fazendo diferença entre “diaconia ampla”, que diz respeito ao serviço prestado pelo crente à luz do sacerdócio universal e mediante o exercício dos dons espirituais, e “diaconia específica”, que diz respeito ao “ministério ordenado da Igreja” na figura dos diáconos chamados para “exercerem este ministério na Igreja”.

Em seguida reforça a autora seu entendimento de que o serviço diaconal não é a mera ajuda com bens materiais e alimentos, mas atuação que visa libertar da opressão. Só assim a pessoa poderá “entender e viver a graça de Deus”, já que “o sofrimento anestesia a compreensão” tornando impossível entender a graça do evangelho.

Posicionamento pessoal

De forma geral parece-me que o texto se propõe a encontrar fundamentos bíblicos para uma atuação voluntária comprometida com libertação e transformação, sobretudo social. Considero o propósito de apresentar a diaconia além do mero assistencialismo algo valoroso, mas entendo que a autora fez considerações que merecem reflexão detida e aprofundada.

Seu conceito de bem-estar é quase materialista, não havendo espaço para uma espiritualidade que sobreviva à escassez, à desigualdade ou à opressão. Ocorre que muitas pessoas convivem e iram conviver com essas situações por toda a sua vida. Não está esquecendo a autora de ponderar afirmações contundentes de Paulo sobre viver contente em qualquer situação e que ele não se deixava guiar pelas circunstâncias? Essa materialização do bem-estar parece-me levar o pêndulo para o lado oposto, sem promover equilíbrio.

Penso que ao procurar levar a diaconia além do assistencialismo a autora arrisca-se a tornar o usufruto do bem-estar dependente da ação do diácono. Assim, para entender a graça divina e experimentar vida plena a pessoa em situação de opressão depende do “serviço de libertação diaconal”. Entendo que a história da igreja demonstra sobejamente que não devemos descartar o sofrimento como veículo da Graça de Deus.

Outra questão que merece reflexão é a manutenção do paradigma clero/laicato, levando a autora a criar as categorias ampla e específica para o serviço. Vejo essa questão como um desserviço ao entendimento, já sofrido em nossos dias, quanto ao sacerdócio universal do crente.

17 julho 2012

A falácia da inclusão


Quando a busca por poder e controle estabelece a naturalidade de uma situação de exclusão, para em seguida promover a inclusão (dentro dos limites do paradigma dominante), aquele que é chamado de vítima, ao se enxergar dessa forma, reforça o paradigma que negou sua natural inclusão. Assim, perpetua a relação dominador/dominado.

Nesse espiral paradoxal quanto mais se atua na direção de incluir alguém em um sistema de dominação mais se fortalece seu modo excludente de ser. A falácia é de que a dignidade vem como resultado de fazer parte de um sistema que foi estabelecido para limitar a dignidade.

Algo parecido acontece hoje em relação à conquista da dignidade por meio do consumo. As muitas vozes em todos os meios de comunicação propalam a ideia de que finalmente a dignidade do cidadão brasileiro está sendo resgatada. A tão falada classe C, antes excluída, agora começa a fazer parte do sistema. Isso significa que estas pessoas começam a ser incluídas para ter acesso ao bem-estar quem antes lhes era negado.

A classe C agora pode comprar o que antes era apenas "sonho de consumo". Eletrodomésticos, móveis, automóveis, eletrônicos, roupas, diversão, tudo está à sua disposição, aparentemente demonstrando que "nunca antes neste país" tantas pessoas foram resgatadas da sub-humanidade para um estado de dignidade humana. É a redenção pelo consumo.

Ocorre que esse modo de vida que valida as pessoas por sua capacidade de consumo não foi estabelecido para gerar dignidade, mas para alimentar o sistema de produção existente, em que se precisa crescer sempre mais para se tornar o dominador do mercado e assim saciar a sede de lucro de seus patrocinadores. O consumo com base na necessidade foi transformado em consumismo movido por anseio de dignidade e apresentado com redentor das gentes.

Nesse caso, penso que a promoção da dignidade e da cidadania se daria pelos valores invertidos do Reino de Deus que afirmam, entre outra coisas, que a vida de alguém não consiste nos bens que ele possui, que aquele que tem o suficiente para sua subsistência (o que comer, onde morar, o que vestir...) deve abrir espaço em sua alma para o contentamento, que as pessoas devem trabalhar para ganhar o suficiente para si e para ajudar quem esteja necessitado (não para acumular), que aqueles que tem alguém a seus serviço devem pagar salários dignos (e não retê-los para si).

No entanto, é mais comum entre os que deseja incluir os excluídos agir exclusivamente na direção de prepará-los para sobreviver no sistema e dar-lhes ferramentas para fazer arrancar a parte que puderem do bolo para si mesmo e seu conforto.

Chega a ser desanimador refletir sobre este estado de coisas, mas continuo crendo que o Bem prevalecerá e um dia, e cada vez mais, as estratégias de poder e dominação que negam o projeto de Deus para a humanidade serão expostas e ridicularizadas por Cristo, suas palavras e seus seguidores.

Texto extraído e editado a partir de minha participação no fórum de discussão realizado no contexto da disciplina "Diaconia e Cuidado" tendo como assunto "Vitimização e desigualdades são faces da mesma moeda". Fórum realizado dentro do formato proposta pela EST - Escola Superior de Teologia.

15 julho 2012

Sacerdotalismo Evangélico


Começo refletindo sobre o contraponto da proposição: clero e povo. O fortalecimento de uma casta sacerdotal é o que há de mais contrário a evangelho libertador de Cristo. Ressalto a questão pelo fato de entender que a simples necessidade de considerar o assunto dessa forma revela quão distante estávamos na época colonial e estamos hoje de experimentar as boas novas do Reino.

O cristianismo colonial luso-brasileiro, a despeito do entendimento de alguns, não inventou nada. Tão somente é herdeiro de uma mentalidade sacerdotal que dominou a religiosidade humana desde épocas imemoriais, serviu de arcabouço e esboço de fé na aliança de Deus com o judeus e foi reformada em Jesus a partir de seu entendimento de que não importa se a adoração é no monte ou no templo em Jerusalém (sob orientação sacerdotal); mas sim que seja em espírito e em verdade.

Nessa abordagem destaco os papéis ativo e passivo destinados respectivamente ao clero e ao povo. O sacerdotalismo bem pode ser visto como uma estratégia de manutenção de poder. É o sacerdote que sabe como a adoração deve ser feita, porque é ele quem sabe como Deus é e como gosta que as coisas aconteçam, portanto ele que está no controle; é o sacerdote que conhece os rituais, os sons, as cores, as palavras que devem e podem ser ditas, o que é bom e o que é ruim, portanto é ele quem deve conduzir o culto; é o sacerdote quem fala do jeito que Deus entende e por isso é ele quem fala com Deus. Ao povo compete a passividade de cumprir as orientações sacerdotais e tentar fazer tudo certinho, torcendo para que Deus não fique irritado caso alguma coisa saia diferente do esperado.

Não devemos nos enganar: o sacerdotalismo não é prerrogativa do catolicismo hierárquico e institucionalizado. Esteve presente nos povos antigos, entre os judeus e tem forte presença na igreja brasileira dita evangélica (reformada, pentecostal ou neo-pentecostal). Quem fala? Quem ensina? Quem ora? Quem se veste diferente? Quem tem destaque sobre os demais? Quem deve ser respeitado mais que os outros? Quem tem as palavras mais sábias? Quem deve ser seguido? O sacerdote!

Penso que a multiplicidade de dons e ministérios na efervescente e libertada igreja neotestamentária foi aos poucos sendo sufocada pelo retorno de um sacerdotalismo que, mesmo ferido de morte pelas palavras e vida de Cristo, ressurgiu alimentado pela natureza caída de um ser humano prepotente e sedento de poder. 

Quando a Graça multiforme de Deus, concedida pelo uso dos múltiplos dons do Espírito na diversidade da igreja é substituída pela confiança em um superministro sacerdotal que concentra em si a comunicação e o acesso à presença divina, a igreja sofre imensamente (como tem sofrido e parece que ainda irá sofrer por algum tempo), subsistindo aquém daquilo que o seu Senhor pensou para ela.

Texto extraído e editado a partir de minha participação no fórum de discussão realizado no contexto da disciplina "História da Igreja na América Latina" tendo como assunto "Religiosidade, Piedade e Teologia na Época Colonial". Fórum realizado dentro do formato proposta pela EST - Escola Superior de Teologia.

O elefante da salvação


Penso que um elemento comum à diferentes igrejas cristãs no Brasil é a salvação. Cada uma observa e entende a salvação por um prisma particular e apresenta-se como defensora e promotora da sua salvação.

Assim, se alguém deixa de beber e fumar para preservar seu corpo, foi salvo; se uma comunidade passa a valorizar a vida humana acima do dinheiro, foi salva; se valoriza a dimensão espiritual e busca uma experiência de transcendência, foi salvo; se defende a vida em suas expressões mais frágeis, foi salvo; se reconhece a responsabilidade de cuidar do planeta, foi salvo.

É como se todos estivessem tateando o grande elefante da salvação (como na história dos cegos) e o descrevendo pelas partes. Tudo isso é salvação, ou melhor, tudo isso resulta de salvação.

Então, um grande desafio para a proclamação do evangelho seria admitir que todos somos parciais em nossa compreensão da salvação, mas todos a desejamos para nós e para os que nos cercam. Cada igreja promove aquilo que acha razoável para explicar e convencer a respeito da salvação que percebe mas, muitas vezes, o faz negando ou diminuindo o entendimento alheio, o que em nada ajuda à compreensão dessa tão grande salvação.

Penso que muito do que entendemos e apresentamos como salvação decorre de uma transação que conhecemos apenas em parte. Algo que não está em nossa dimensão, embora que seus sinais e marcos tenham invadido a humanidade na pessoa de Cristo. Quem sabe, então, se nos detivéssemos a explorar essa tão grande salvação, compreender e experimentar os seus aspectos multifacetados, passaríamos a percebê-la mais presente operando na vida daqueles que nos cercam e a proclamação seria uma grande orquestra de sons harmoniosos.

Quem sabe se a salvação da confissão se juntasse à salvação da espiritualidade e à salvação revolucionária à salvação da proclamação e a todas a demais teríamos boa chance de impactar nossa geração com as boas notícias do Reino de Deus.


Texto extraído e editado a partir de minha participação no fórum de discussão realizado no contexto da disciplina "História da Igreja na América Latina" tendo como assunto "Religiosidade, Piedade e Teologia na Época Colonial". Fórum realizado dentro do formato proposta pela EST - Escola Superior de Teologia.

Hipertrofia do ministério pastoral?


Suas perguntas, Daniel, são pertinentes e estão inseridas em um contexto específico: este no qual os pastores se tornaram uma espécie de parte do corpo do Cristo que cresceu além do que lhe estava reservado, tornando o corpo desproporcional e necessitando de cuidados extras.

Sobre os pastores repousam responsabilidades que, no meu entender, deveriam ser cumpridas por outros membros do corpo de Cristo. Onde estão os profetas, onde estão os mestres e evangelistas? Onde estão os que têm dom discernimento e sabedoria? Nós não os encontramos mais e, porque a função que eles exercem são necessárias ao corpo, esperamos que o superministro do evangelho supra tudo. Para isso, é claro, é necessário "tempo integral" dedicação exclusiva para fazer tudo muitos outros deveriam fazer.

Abandonados os mandamentos recíprocos e o sacerdócio universal do crente, voltamos ao sacerdotalismo e, neste caso todas as suas perguntas precisam ser respondidas. No entanto, como seria se decidíssemos convidar o Espírito a suprir sua igreja com homens e mulheres com os mais diversos dons e habilidades necessárias ao crescimento do corpo em amor? Como seria se ao reunir-se a igreja um tivesse um salmo, outro um cântico, um outro o testemunho e ninguém, senão o Cristo vivo fosse o centro de tudo o que acontece?

O seu raciocínio quanto à necessidade do carro para visitar irmãos em diversos hospitais espalhados pela cidade é o mesmo usado pelos televangelistas para aquisição de seus jatinhos. Como eles poderão deslocar-se a tempo de atender aos compromissos espalhados pelo país a fora? Mas a pergunta deveria ser por que a igreja alça algumas pessoas e as coloca sobre pedestais, considerando-as acima dos mortais comuns e responsáveis por fazer acontecer a igreja?

Por que continuamos transformando nossos líderes em âncoras da nossa fé, quando Jesus explicou que não devemos colocar ninguém nessa posição? Será que não esta na hora de reconhecermos os danos que a hipertrofia do pastorado tem causado à igreja de Cristo e retornamos ao ministério do Espírito através da multiplicidade da graça de Deus?

Entendo que se os paradigmas forem mudados as perguntas serão outras e os problemas a serem enfrentados também mudarão. Assim, quem sabe, todos terão o direito de viver com simplicidade, não miseravelmente, mas grato com o que é necessário para uma vida de testemunho e anunciação do Reino de Deus.


Texto extraído e editado a partir de minha participação no fórum de discussão realizado no contexto da disciplina "História da Igreja na América Latina" tendo como assunto "Religiosidade, Piedade e Teologia na Época Colonial". Fórum realizado dentro do formato proposta pela EST - Escola Superior de Teologia.

14 julho 2012

Cruzadas Pós-Modernas


Entendo que o Jesus guerreiro das cruzadas medievais era tão somente um ícone, uma bandeira sob a qual se aliaram os poderes econômico, político e religioso.

A igreja, seduzida pelas oferendas do dinheiro e do poder, forjou um Cristo violento ao invés daquele que orientou a oferecer a outra face; um Cristo interessado em conquistar e expandir um império ao invés daquele que afirmou que seu Reino não é deste mundo; um Cristo cuja a aparência é semelhante aos que dominam ao invés do Cristo que tinha a cara dos dominados.

Quando seguir a pessoa de Jesus é substituído por usar a imagem do Cristo, saímos da dimensão do "Reino de Deus" para entrar naquilo que poderia ser chamado de reino dos crentes, no qual a imagem de Cristo é volúvel e se apresenta conforme as necessidades de expansão dos negócios do reino.

Assim, o Jesus de alguns crentes em nossos dias é aqueles que está interessado em expandir as fronteiras denominacionais como uma espécie de defensor da ortodoxia doutrinária. É um Jesus estudado, intelectual, aristocrata que domina pela superioridade dos argumentos teológicos.

O Jesus aristocrata não sente a dor dos pequenos, pobres e oprimidos pelos pecados seus e do mundo. Ao invés de lamentar pelo povo, como aquele dos evangelhos, porque são como ovelhas sem pastor, o guerreiro da ortodoxia reforça a doutrina relembra a importância de se conhecer o modo certo de crer e as coisa certas em quais se deve crer.

Outra imagem é a do general, que guerreará pelos seus e os colocará em posição de superioridade; como cabeça e não como calda. O Jesus guerreiro que defende os seus com força e poder e por isso "mil cairão ao seu lado e dez mil a sua direita" mas os seus não serão abalados. É um Jesus adepto da filosofia: "aos amigos tudo; aos inimigos a lei".

Ao Jesus guerreiro pede-se vitória em concurso público mesmo se a pessoa não tiver estudado; pede-se que o guarda não multe o ônibus sem condições, que leva os irmãos ao acampamento; clama-se para que a fiscalização seja complacente com a falta de autorização para realizar um show gospel em espaço público. Afinal ele está do lado dos crentes.

Percebo que todo desvio, mesmo que seja leve, da imagem pela qual Cristo se apresentou nos evangelhos tem o potencial de instrumentalizar Cristo em prol de propósitos incoerentes com o Reino de Deus, embora alinhados com o reino dos crentes.



Texto extraído e editado a partir de minha participação no fórum de discussão realizado no contexto da disciplina "História da Igreja na América Latina" tendo como assunto "Religiosidade, Piedade e Teologia na Época Colonial". Fórum realizado dentro do formato proposta pela EST - Escola Superior de Teologia.

A salvação dos judeus


Acho temerária toda generalização. Definir de uma tacada só o destino dos judeus não me parece um bom caminho. Veja que quando o próprio Jesus esteve entre nós muitos deles o receberam, mas outros o rejeitaram. Isso deve servir de alerta de que a salvação diz respeito ao relacionamento de cada pessoa com aquele que é a encarnação do amor de Deus. Veja como Pedro se dirige aos seu compatriotas e irmãos de fé:

Então Pedro, cheio do Espírito Santo, disse: "Ilustres líderes e anciãos da nossa nação, se os senhores se referem à cura realizada no paralítico, e como aconteceu, permitam que eu claramente afirme aos senhores e a todo o povo de Israel que isto foi feito no nome e no poder de Jesus de Nazaré, o Messias, o Homem que os senhores crucificaram - mas Deus ressuscitou. É pela autoridade dEle que este homem se acha aqui curado! Porque Jesus, o Messias, é Aquele a quem se referem as Escrituras quando falam de uma 'pedra rejeitada pelos construtores que se tornou a pedra principal da esquina'. Não há salvação em nenhum outro mais! Debaixo do céu inteiro não existe nenhum outro nome para os homens chamarem a fim de serem salvos". Ats 4:8-12

Parece-me, então, que Pedro está dizendo bem claro que a promessa de salvação dada por Deus aos descendentes de Abraão se cumpriu em Cristo. Logo, quando alguém que espera a promessa feita a Abraão rejeita a Cristo, virando as costas àquele que tanto esperava, certamente não se encontra em posição de requerer novo cumprimento da promessa já cumprida em Jesus.

Tratando de questão paralela, Paulo testemunha sobre a reação dos judeus (e dos gentios) de seu tempo à boa noticia de que a promessa dada ao judeus havia se cumprido com abrangência para o mundo todo, reações que me parecem presentes também em nossos dias.

"Deus, em sua sabedoria, providenciou para que o mundo nunca encontrasse a Deus através da inteligência humana. E então Ele se manifestou e salvou todos quantos creram em sua mensagem - essa mesma que o mundo considera absurda e ridícula. Parece absurda para os judeus, porque eles desejam um sinal do céu como prova de que o que está sendo pregado é verdadeiro; e é ridícula para os gentios, porque eles crêem somente naquilo que concorde com a sua filosofia e lhes pareça sábio. Por isso, quando pregamos que Cristo morreu para salvá-los, os judeus se ofendem e os gentios afirmam que tudo isso é disparate." 1Co 1:21-23.

Texto extraído e editado a partir de minha participação no fórum de discussão realizado no contexto da disciplina "Temas do Novo Testamento" tendo como assunto "Salvação somente por Jesus?". Fórum realizado dentro do formato proposta pela EST - Escola Superior de Teologia.

O protestantismo colonial


Síntese do texto "Temas da História da Igreja na América Latina: O Protestantismo Colonial" escrito por Wilhelm Wachholz. Produzido dentro dos limites de forma exigidos pela EST - Escola Superior de Teologia como requisito da disciplina História da Igreja na América Latina. 

Franceses Huguenotes

Depois de estabelecer as hipóteses mais comuns a respeito da história do nome huguenotes e posicionar seu surgimento no contexto da reforma protestante europeia, o autor passa a comentar os contatos ocasionais de protestantes no Brasil Colônia. Considera que nos três primeiros séculos desde a chegada dos portugueses é apenas nesses termos (contato ocasionais) que se pode falar da presença protestante em terras brasileiras.

O autor, de certa forma, justifica essa ocasionalidade ressaltando que o contexto histórico da disputa por hegemonia marítima e comercial levava consigo também a componente religiosa. Assim, o expansionismo português e espanhol trabalhava também em prol do estabelecimento de uma cristandade católica, projeto para o qual a presença protestante era uma ameaça.

A França Antártica desejada por Villegaignon era um projeto multifacetado com vários patrocinadores e interesses múltiplos. Ressalta o autor que o próprio Villegaignon era movido por fortuna e fama enquanto a França buscava terras, Calvino queria responder ao desafio missionário e Coligny ansiava por liberdade religiosa. Vê-se também que, da mesma forma que portugueses e espanhóis, os franceses atuaram como exploradores, e dessa maneira eram vistos inclusive pelos índios.

Segundo o texto, pode-se compreender que o protestantismo no Brasil deu seus primeiros passos amparado por frágeis “conversões de ocasião”, no caso, Villegaignon e Cointac. Certamente, à luz dos patrocinadores da empreitada, pareceu sensato a Villegaignon abdicar da fé católica e aderir ao protestantismo. Sua flexibilidade em matéria de fé, no entanto, não obteve resposta semelhante entre os pastores protestantes surgindo uma grave celeuma a respeito de pontos aparentemente periféricos, como liturgia e vestimenta. A convicção dos pastores protestantes e o confronto aberto que travaram com a autoridade constituída foram interpretados como séria ameaça ao status quo e reprimidos com tal.

Destaque-se que a interferência de Villegaignon nos assuntos de fé pode ter sido interpretada pelos pastores como uma ameaça precoce à liberdade religiosa ansiada pelos protestantes vindos da França, e por isso repudiada de pronto. A essa interferência, os pastores respondem com uma confissão doutrinária, um documento para dentro do ambiente religioso.

Assim, fica claro que esta primeira incursão protestante pouco tinha a apresentar quanto à missão evangelizadora do povo da terra, perdendo-se em meio a disputas internas de poder e na repetição dos embates menos brilhantes entre reforma e contrarreforma. Por outro lado, não se pode negar a importância da Confessio Fluminensis, documento produzido como afirmação de uma visão protestante sobre importantes pontos doutrinários; ainda que na época não tenha tido qualquer repercussão além da morte de seus propositores e o fim de um possível Brasil protestante.

Holandeses Calvinistas

Quanto à presença dos holandeses calvinistas no Brasil, deve-se primeiro destacar que veio a reboque dos interesses comerciais (à semelhança dos portugueses católicos) e no contexto das disputas políticas e expansionistas vigentes na Europa.

Durante 24 anos os holandeses estiveram presentes do Maranhão até a foz do rio São Francisco, inclusive ocupando cidades como Recife e Olinda, atuando através da Companhia das Índias Ocidentais. No entanto, diferente dos portugueses (e da tentativa huguenote), os holandeses adotaram como prática a tolerância religiosa, permitindo o exercício da fé judaica e católico romana.

A presença calvinista ganhou elementos de diferenciação prática pelas mãos de Maurice de Nassau. Ao mesmo tempo em que apoiava a edificação de templos e congregações, Nassau pessoalmente arregaçava as mangas e se engajava em questões práticas ligadas à vida do vilarejo de Recife. A interpretação dos moradores foi de que não havia ali o mero desejo de explorar e passaram a envolver-se pessoalmente com os projetos de Nassau.

Fiéis à tradição reformada, os calvinistas holandeses estabeleceram um atuação religiosa compartilhada, menos centrada no sacerdote. Assim, havia os anciãos para as tarefas administrativas, os diáconos para a assistência aos necessitados e os consoladores de enfermos para as visitas pastorais. À luz da concepção reformada de teocracia, os calvinistas criam na necessária interação entre ministério eclesiástico e autoridade civil, o que os levou a estabelecer instâncias políticas com atuação no âmbito das relações civis.

Também havia entre os calvinistas holandeses o desejo de cumprir a Missão. Assim, adotaram dos Jesuítas o sistema de aldeamento para alcançar o povo da terra; separando-se inclusive o um missionário para cuidar da evangelização dos indígenas na Paraíba. Chegou-se a compor um catecismo trilíngue (tupi, holandês e português), mas a obra sofreu objeções da igreja da metrópole.

Se por um lado a tolerância religiosa pode ser elencada com um diferencial marcante da ocupação holandesa no Brasil, o autor destaca que os calvinistas holandeses, embora professassem uma ética de dignificação do trabalho, não resistiram à tentação escravocrata, sistema que era a base da economia açucareira e sustentação do colonialismo. Mantiveram a economia girando ao preço da opressão, privação de liberdade e desprezo pela dignidade humana, e não apenas no Brasil.

As sementes lançadas em solo brasileiro bem poderiam ter resultado em bons frutos, mas os holandeses retiraram-se do Brasil movidos por outros interesses ligados à conjuntura político-econômica na Europa; nisso também se percebe que a Missão era tão somente mais um vagão no trem da expansão do colonialismo europeu (católico ou protestante).

Conhecendo sua equipe


Por Rick Boxx

Pesquisa feita por uma rede de executivos descobriu que muitos CEO’s não conhecem seu pessoal tão bem quanto pensam. Quase 10% dos executivos pesquisados responderam que o equilíbrio entre trabalho e vida pessoal era importante para eles, mas poucos desses CEO’s acreditavam que isso tinha importância para seus liderados.

Entretanto, quando pesquisados, muitos desses liderados revelaram que seu interesse em equilibrar trabalho e vida pessoal era duas vezes maior do que esperavam seus CEO’s. A disparidade dessa pesquisa aponta que esses líderes precisam ter melhor compreensão das necessidades e desejos dos que trabalham para eles. 

Jesus falou sobre a importância dos líderes terem relacionamento forte e crescente com seus liderados. Fazendo comparação com o que ocorre na agropecuária, Ele afirmou em João 10.14: “Eu sou o bom pastor... Conheço as Minhas ovelhas, e elas Me conhecem”. 

Por Sua observação pessoal, Jesus compreendeu quão inconstante e desamparado um liderado pode ficar, sem o cuidado vigilante de seu líder. Ele conhecia bem Seu rebanho e sabia que as ovelhas também precisavam conhecê-lo. Aplicando este princípio ao ambiente de trabalho é igualmente importante dedicarmos tempo e energia necessários para conhecer os homens e mulheres sob nossa gestão – e que eles também nos conheçam melhor. 

Sei de inúmeras ocasiões em que CEO’s e altos executivos dedicaram alguns minutos todos os dias para passar pelos postos de trabalho dos empregados, a fim de conhecê-los e perguntar sobre suas famílias, buscando saber como se sentiam pessoal e profissionalmente. 

Outra passagem da Bíblia fornece analogia sobre o cuidado com o rebanho, que fornece mais um bom motivo para sermos diligentes e buscarmos compreender bem as pessoas que trabalham para nossas organizações: 

“Esforce-se para saber bem como suas ovelhas estão, dê cuidadosa atenção aos seus rebanhos, pois as riquezas não duram para sempre, e nada garante que a coroa passe de uma geração a outra. Quando o feno for retirado, surgirem novos brotos e o capim das colinas for colhido, os cordeiros lhe fornecerão roupa, e os bodes lhe renderão o preço de um campo. Haverá fartura de leite de cabra para alimentar você e sua família, e para sustentar as suas servas” (Provérbios 27.23-27). 

Conhecer a “condição das ovelhas”, aqueles que estão sob nossa liderança, ajudará a assegurar que sejam tão produtivas quanto possível, desempenhem bem as funções que lhes são atribuídas e permaneçam satisfeitas em seus empregos. 

Se você ocupa cargo de liderança, seja sábio em separar tempo necessário para conhecer e compreender sua equipe. Faça perguntas. Ouça. Ofereça-lhes oportunidade de conhecer você melhor.  Quando pressionado por prazos e detalhes, isso pode parecer inconveniente ou incômodo, mas os dividendos obtidos com seu investimento pessoal de tempo e cuidado serão substanciais. 



Rick Boxx é presidente e fundador da "Integrity Resource Center", escritor internacionalmente reconhecido, conferencista, consultor empresarial, CPA, ex-executivo bancário e empresário. Adaptado, sob permissão, de "Momentos de Integridade com Rick Boxx", um comentário semanal acerca de integridade no mundo dos negócios, a partir da perspectiva cristã. Tradução de Mércia Padovani. Revisão e adaptação de J. Sergio Fortes (fortes@cbmc.org.com). MANÁ DA SEGUNDA® é uma reflexão semanal do CBMC - Conecting Business and Marketplace to Christ, organização mundial, sem fins lucrativos e vínculo religioso, fundada em 1930, com o propósito de compartilhar o Evangelho de Jesus Cristo com a comunidade profissional e empresarial. © 2008 - DIREITOS RESERVADOS PARA CBMC BRASIL - E-mail:liong@cbmc.org.br - Desejável distribuição gratuita na íntegra. Reprodução requer prévia autorização. Disponível também em alemão, espanhol, francês, inglês, italiano e japonês. Somos contra o SPAM na rede e em favor do direito à privacidade. Esta mensagem não é considerada SPAM, pois o remetente está identificado, o conteúdo claramente descrito e com a opção de exclusão de seu e-mail. Para exclusão do seu nome de nossa lista de mailing, por favor, envie um e-mail para aristarco.coelho@gmail.com escrevendo "REMOVER" no campo de assunto.



Conquista e Evangelização no Brasil


Síntese do texto "Temas da História da Igreja na América Latina: A Conquista e Evangelização do Brasil" escrito por Wilhelm Wachholz. Produzido dentro dos limites de forma exigidos pela EST - Escola Superior de Teologia como requisito da disciplina História da Igreja na América Latina.

O Discurso e a Prática Missionária

O autor apresenta três conceitos-base em relação à evangelização da AL e do Brasil: o primeiro deles parte do entendimento de que a cultura nativa encontrava-se imprestável e, por isso, era preciso começar “do zero”; o segundo identifica na cultura pré-existente elementos recuperáveis e tenta inserir-se no contexto cultural para comunicar; o terceiro considera os indígenas e sua cultura não apenas como objetos passivos da ação evangelizadora, mas como sujeitos ativos no processo.

No texto é caracterizado o discurso eclesiástico que veio junto com a colonização portuguesa. O espírito expansionista forjou uma igreja que não conhecia fronteiras para sua atuação, entendia-se responsável pelo doutrinamento dos povos pagãos e agia opressivamente, emulando o espírito belicoso comum às grandes navegações.

Conforme relacionado pelo autor, paralelo ao mundo das ideias sobre evangelização havia também experiências de evangelismo mediante completa imersão cultural e empatia dos evangelizadores com as lutas vividas pelos evangelizados.

No todo, compreende o autor que a evangelização no Brasil deu seus primeiros passos seguindo “as ‘pegadas’ do projeto colonial português”. Colonização e evangelização andaram juntas e muitas vezes foram confundidas.

Destaco o fosso existente entre o entendimento expresso por Paulo III em Sublimis Deus (1537) e a prática evangelizadora da igreja na AL. É necessário articular a fé, mas não é suficiente, porque fé é modo de viver. Acrescento que a percepção da evangelização como vivência, conforme relaciona o autor, exigiu não um tempo para escrever um texto, mas uma vida inteira de dedicação às pessoas: Gorzoni, 50 anos; Livorno, 31 anos e Encarnação, 30 anos. A fé imposta é estrangeira, a fé compartilhada é nossa.

O padroado

O padroado, uma simbiose entre os poderosos, foi responsável por um cenário em terras brasileiras no qual as ações evangelizadoras deveriam ser autorizadas, remuneradas e monitoradas pela coroa portuguesa e seus representantes. O salário dos clérigos, as ordens religiosas autorizadas ou o número de missionários admitidos, tudo era decidido de acordo com as necessidades do sistema colonial português. Desta forma, assim como no contexto político e social, o chefe da missão era o rei, não Papa.

O relacionamento de dependência e subserviência promovido pelo padroado, segundo sugere o autor, é corresponsável, na colônia, por uma relação paternalista com as instâncias de poder. Acresça-se a isso a mimetização pela igreja do modus operandi do sistema colonial, pelo qual as riquezas exploradas (também os dízimos arrecadadas) eram em parte devolvidas em forma de aliciamento (doações, privilégios e subsídios).

Entendo que os danos causados pela relação de dependência da igreja em relação ao poder econômico-político são imensos e se fazem presentes ainda hoje. A igreja aprisionada esqueceu a missão libertadora dos fracos e oprimidos e adotou a submissão aos caminhos da prosperidade dos poderosos. Acrescento o aprendizado malévolo do aliciamento mediante privilégios e da opressão como formas de relacionamento aceitáveis.

Os Ciclos Missionários

Seguindo os passos da colonização, o autor apresenta ciclos missionários: Litorâneo, Sertanejo, Maranhense, Mineiro, Paulista, Francês, Holandês e Inglês. Destaca-se participação das ordens religiosas conforme seu envolvimento em cada etapa e são pinçados eventos, fatos ou personagens que merecem ser ressaltados, no entender do autor.

Litorâneo (1549-1654). Destaca-se a participação dos Jesuítas, autorizados por Dom João II, que instalaram aqui o modelo de “colégio-aldeamento”. Desde sua chegada eles envolveram-se com os nativos e acreditavam na possibilidade da ordenação sacerdotal de brasileiros mestiços. Demonstraram apreço pelos idiomas indígenas e encorajaram que aqui se falasse o “brasílico” (uma mistura de idiomas da qual fazia parte o Tupi).

Sertanejo (1655-1760). Caracterizado pela necessidade de alimentar o engenho e supri-lo de mão de obra, neste ciclo o destaque é para capuchinhos e oratorianos. Eles não estavam vinculados ao padroado português e, por isso, gozavam de certa liberdade e trouxeram “o método e a teologia baseado no concílio de Trento”.

Maranhense (1615-1759). Marcado pela saída dos franceses de São Luís, neste ciclo há a participação de mercedários, capuchinhos, carmelitas, franciscanos e jesuítas, divididos entre as margens direita e esquerda do rio Amazonas.

Mineiro (a partir de 1700). De início tratava-se de uma missão leiga a partir dos ermitães, influenciados pela renovação espiritual no final do século XVII. Eles se contrapunham à desordem moral e ao luxo excessivo bancado pelo ciclo do ouro e pregavam a oração meditativa, a revalorização do sacramento da penitência e a vida austera. Seu trabalho alcançava brancos, mulatos, crioulos e negros.

Paulista (1554-1640). Caracterizado pelos conflitos entre colonos e indígenas na evangelização de Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso e na Região Sul. A descoberta de ouro arrefeceu o interesse da coroa em cristianizar os indígenas, já que havia mão de obra mais apropriadas entre as populações negras.

Destaco a oposição no procedimento de franciscanos e jesuítas. No descrever do autor, os primeiros são como “Profetas do Rei”, mantendo o status quo que os alimentava, enquanto os jesuítas mantinham seu foco nas pessoas.

Ressalto também que o sistema colonizador, com habilidade, usava cada ordem religiosa conforme sua necessidade expansionista. E as descartava quando o trabalho de uma ou de outra não se fazia necessário ou era considerado um estorvo. Atrelados e submetidos ao poder como estavam, aqueles irmão submetiam-se às migalhas, fazendo que lhes parecesse possível. Parece-me claro que, ressalvadas a exceções, o ímpeto missionário não tinha vida própria, mas rezava na cartilha do poder.

03 julho 2012

Espírito Santo e Batismo



Estou chegando com as discussões já a todo vapor, mas certamente não poderia deixar de tentar contribuir com minha posição sobre o assunto, que é controverso mas de suma importância.

Creio pela revelação da Palavra e pelo testemunho em meu próprio espírito que é pelo Espírito Santo (ES) que somos conquistados para Deus. Ele nos atrai, convence, regenera, encoraja, consola, corrige e nos preserva para o último dia. Portanto, não há vida em Cristo se não houver a ação poderosa do Espírito a produzir em nós novas pessoas outorgando-nos a posição de filhos e zelando por nossa caminhada com Cristo.

Entendo que a guerra de preposições (em, no, dentro, fora, ao redor... sei lá!) quanto à forma de atuação do Espírito não ajuda muito, mas confunde bastante. Essa tentativa de esquadrinhar os movimentos e atuações do ES vai contra a sua natureza (o vento sopra onde quer). Portanto me atenho à verdade simples de que o ES é o mover poderoso do Deus trino: ele age em todo o universo e sob todas as preposições que possamos imaginar.

Minha interpretação dos textos bíblicos me leva a compreender os eventos dos primeiros capitulo de Atos, quando o Espírito cumpre a profecia de Jesus (E também de Joel), como um momento peculiar e único no tempo. Nem os que experimentaram, ou mesmo os que relataram os fatos, o fizeram como se fossem normativos ou como exigência para isso ou para aquilo. Acho, portanto, que a leitura a posteriori em busca de regras e normas a serem aplicadas em todos os tempo é um caminho limitador; uma tentativa de controlar o agir de Deus.

Estou convicto de que o ES passa a habitar de forma plena e irreversível na vida daqueles que abrem mão de suas próprias soluções e depositam sua confiança, ainda que frágil, no amor de Deus revelado em Jesus Cristo. Neste momento, creio, aquele que se rendeu ao amor de Deus é mergulhado no Espírito Santo e selado para a eternidade (e ninguém o arrebatará das mãos Dele). Este batismo no Espírito é a porta de entrada para a comunidade daqueles que foram remidos pelo sangue do cordeiros, tiveram seus nomes escritos no livro da vida e receberam o selo da adoção que os permite falar: Abba Pai.

Ao ler os textos bíblicos (não apenas em Atos, mas também nas cartas paulinas) sou levado a concluir que o batismo nas águas tem grande importância simbólica daquilo que já ocorreu na vida do seguidor de Jesus: ao mergulhar, morte para o mundo; ao emergir, ressurreição para uma nova vida - a vida do ES em nós. Portanto não vejo no batismo em si qualquer comunicação de graça ou poder para remir pecados. Não desprezo, no entanto, o simbolismo que decorre do entendimento de que fomos regenerados como membros de um nova família e com ela assumimos compromissos e responsabilidades.

Entendo também que os seguidores de Jesus carecem profundamente da ação e do poder do ES para viverem sua nova vida. O derramamento do ES acontece de forma contínua na capacitação que recebemos para viver a vida de Cristo. Por outro lado, esse mesmo Espírito será percebido de forma especial quando somos empoderados e capacitados a proclamar com ousadia a mensagem do evangelho.


Aristarco Coelho


Texto extraído e editado a partir do fórum de discussão realizado no contexto da disciplina "Temas do Novo Testamento" tendo como assunto "Batismo no Espírito Santo". Fórum realizado dentro do formato proposta pela EST - Escola Superior de Teologia.

01 julho 2012

Salvação pela integridade?




Seu ponto de vista está começando a ficar mais claro, Simone, no entanto ainda tenho algumas dúvidas sobre o comentário anterior e outras que surgiram a partir de seu novo comentário.

Você apresenta a salvação como resultado de um mix de fé e vida íntegra, isto é, a pessoa precisa confiar em Jesus e apresentar determinados comportamentos, como integridade e retidão, para ser aceita por Deus. Embora compreenda, como já afirmei em outro comentário, que a fé produz uma vida íntegra que agrada a Deus, não posso concordar que a integridade é que resulta em nossa aceitação por Deus. Ele nos salvou por sua graça e misericórdia quando estávamos mortos em nossos delitos e pecados, portanto nosso nível de integridade era zero.

Acho que compreendi a relação que você fez entre fé e graça, mas tenho algumas restrições aos termos usados. Prefiro o entendimento de que a fé não é um instrumento para nos apoderarmos da Graça, mas sim um relacionamento de confiança crescente em resposta ao amor de Deus por nós; também acho que nosso contato com a Graça de Deus não se dá em termos de "apoderamento", como se o processo estivesse sob nosso controle, mas compreendo que somos alcançados por esta graça em uma iniciativa que não é nossa.

Não compreendi bem o que seria o "estado de graça" a que você se referiu nesse último comentário. Por outro lado, entendo que é a graça de Deus, expressa no amor em forma humana chamado Jesus, que destranca as portas da desconfiança para que minha resposta de fé seja possível. Assim, é a graça de Deus que conduz à fé, e é a confiança em Deus que resulta em salvação. Isto era assim no AT e é assim a partir de Cristo

É interessante este diálogo porque embora a palavras que estamos usando sejam as mesmas o significado que damos elas são diferentes. Ainda assim estamos juntos no propósito de caminhar com Cristo em novidade de Vida.

Aristarco Coelho




Texto extraído e editado a partir do fórum de discussão realizado dentro do contexto da disciplina "Temas do Novo Testamento" tendo como assunto "Exclusivismo, inclusivismo e pluralismo religioso". Fórum realizado dentro do formato proposta pela EST - Escola Superior de Teologia.

28 junho 2012

História da igreja na AL - Questões introdutórias


Síntese do texto "Temas da História da Igreja na América Latina: Questões introdutórias e periodizações" escrito por Wilhelm Wachholz. Produzido dentro dos limites de forma exigidos pela EST - Escola Superior de Teologia como requisito da disciplina História da Igreja na América Latina.

Igreja Encarnada: o Já e o Ainda não 

As indagações iniciais do texto repousam sobre a pertinência de uma “História da Igreja”. Fundamentado na encarnação de Jesus, que se submeteu à história humana ( Deus fazendo-se história junto com sua criação), o autor advoga que da mesma forma a natureza da Igreja não é etérea, mas encarnada, submetida aos processos históricos humanos. Assim, a igreja do primeiro século estava relacionada às circunstâncias históricas lá existentes, enquanto a igreja do século XXI é chamada a lidar com os desafios deste século. Conclui o autor que, portanto, não é possível “conhecer e compreender a igreja se não conhecermos sua história”.

Parece bastante razoável o entendimento de que a Igreja, feita de pessoas, está mergulhada na história humana e, portanto, será melhor compreendida à medida em que sua história é desvelada: cristo encarnado e igreja encarnada fazem parte da história e, por isso passíveis de estudo.

A História da Igreja no Contexto da Teologia

Após contrapor as posições de Bauer e Harnack de um lado e Karl Barth de outro, o autor apresenta sua posição sobre o questionamento a respeito da necessidade da História da Igreja para a Teologia. O ponto é semelhante ao anterior, advogando o texto que se Deus participa da história humana, dentro das limitações que ela tem, a compreensão histórica de sua encarnação é indispensável para a jornada em busca de conhecê-lo.

O ponto é que Deus, ao invadir a dimensão tempo e espaço, fez história, tornando indissociável a conexão teologia e história da igreja.

O Objetivo da História da Igreja

Depois de destacar os pontos de vista de Gerhard Ebeling (compreensão das Escrituras), Heinrich Bornkamm (o evangelho e seus efeitos no mundo) e Kurt Schmidt (Cristo e seu permanente agir no mundo), o autor apresenta como objetivo da História da Igreja ler a trajetória humana a partir do próprio Deus, integrando em um mesmo cenário histórico as ações humanas e as intervenções divinas.

História e sua Atualidade na Teologia

O texto aponta o iluminismo como marco a partir do qual a igreja passou a ser considerada como objeto histórico. Isso aconteceu, a despeito das muitas resistências, pela superação da dicotomia entre história profana e história metafísica. Considerações importantes do autor a partir de Alberigo e Wirth reforçam a inexistência de uma igreja fora do tempo e do espaço, a necessidade de rigor científico na abordagem histórica da igreja, a libertação do conceito de igreja do jugo da hierarquia institucional e uma teologia histórica a partir da fé rumo à libertação.

Conclui o autor ressaltando a história como disciplina ao mesmo tempo transformadora, uma vez que impulsione “a reflexão sobre a dignidade e valores da vida” e em transformação, uma vez que disposta a indagar o passado, alterá-lo conforme a verdade e assim refazer-se no presente para construir um novo futuro.

Uma História Religiosa ou não religiosa da Igreja?

O autor aborda de forma rápida a questão afirmando que não a história não ser correta ou legítima a depender do ponto de partida (motivação ou interesse do historiador). No entanto ressalta a necessidade de que seja científica em sua metodologia. O texto evoca uma cooperação entre historiadores crentes ou não.

Ressalte-se que ao tentar exemplificar a cooperação, o autor não foi muito claro quanto à contribuição do “cientista crente”.

Novos Paradigmas para a História da Igreja

Refletindo sobre a historiografia da Igreja na América Latina, o autor apresenta três questões básicas a serem consideradas: primeiro o zelo por uma história realmente ecumênica, depois uma necessária consideração produção que leve em conta o destinatário da história e por último a necessidade de uma historiografia que articule a prática da comunidade cristã.

Problemas para uma periodização da história da igreja na América Latina

Considera o texto que apesar de a história acontecer de forma contínua, para estudá-la faz-se necessário marcar limites e indicar etapas mediante a adoção de determinados critérios. A questão que se coloca, então, é qual deve ser o ponto de partida desses critérios: acontecimentos intra-eclesiásticos ou extra-eclesiais. O ponto de vista do autor é claro ao afirmar que os extra-eclesias acabam sobrepondo-se e que “não se deve imaginar uma periodização ‘puramente eclesiástica’”.

A CEHILA propôs em 1973 que a história da igreja na América Latina fosse tripartite quanto às épocas (1492-1808, 1808-1930 e 1930- ), que estariam divididas em oito períodos; Enrique Dussel (1984) apresentou outra proposta também tripartite, mas com alterações no corte e no critério: para as épocas foram usados fatores de ordem econômica enquanto que para os períodos a referência foi sócio-política.

Enrique Dussel, Eduardo Hoornaert e Alberto Methol Ferré apresentaram periodizações tripartites, embora tenham usado diferentes critérios. O autor destaca a crítica de Prien que se aplica aos três esquemas: não há referência ao antes da chegada dos europeus, o foco é quase exclusivamente no desenvolvimento da Igreja Católica e a leitura quanto à ruptura ao final da época colonial é tardia e deve ser localizada no Iluminismo.

Prien propôs, então, a seguinte periodização: 1. As bases étnicas, culturais e religiosas da AL; 2. O desenvolvimento do cristianismo latino-americano sob o signo do modelo da cristandade; 3. A crise da cristandade latino-americana na época do iluminismo e emancipação política; 4. Igreja e sociedade entre restauração e secularização; e 5. O cristianismo na época do ecumenismo e da crise dos estados oligárquicos nacionais no conflito do desenvolvimento.

24 junho 2012

Onde está o teu irmão?


Esta semana uma notícia no Jornal da Paraíba destacou a decisão do Conselho Tutelar de se fazer presente no maior São João do mundo, que acontece no Parque do Povo em Campina Grande. Entre outros, o objetivo é de coibir a venda de bebida alcoólica a crianças e adolescentes.

Parece-me que o comércio de bebida alcoólica para crianças e adolescentes pressupõe duas realidades: de um lado, meninos e meninas desejosos de viver a vida intensamente, ainda que irresponsáveis ou sem noção clara das implicações e riscos envolvidos; de outro, comerciantes dispostos a lucrar com um negócio capaz de destruir vidas humanas a médio e longo prazo, mas repleto de alegria no curto prazo.

Comerciantes vivem de comprar e vender, isso é claro, mas não deixo de me surpreender com homens e mulheres adultos, presumivelmente maduros, que em troca de uns trocados oferecem a crianças a chave capaz de abrir o caminho para uma vida de lamento e tristeza. Não têm eles mesmo filhos e filhas cuja a memória lhes sirva de freio? Não vêem o tempo todo gente destroçada pelo consumo abusivo de álcool? Não sabem ao menos que a lei proíbe colocar na mão de adolescentes uma droga capaz de produzir adicção?

É bem possível que a resposta seja sim para cada uma dessas perguntas, no entanto, não estão funcionando. Por quê? Parece-me que essas circunstância não são suficientes e de nada adiantam se não houver também o sentimento de irmandade.

Talvez meu ponto de vista fique mais claro se retornarmos ao episódio dos primeiros irmãos, Caim e Abel. Cometida a loucura contra seu irmão, Caim silenciou. Deus não. Ele se dirige a Caim e faz uma terrível pergunta: "onde está o seu irmão?". A pergunta, simples e direta trás consigo a compreensão de Deus para a vida que ele criou, de que somos responsáveis uns pelos outros. Caim compreendeu e reagiu tentando fugir às responsabilidades daquele chamado à irmandade: "Como posso saber? Acaso sou babá do meu irmão?".

Não somos responsáveis pelas decisões que outros tomam por sua conta e risco, mas somos completamente responsáveis por nossas decisões e o impacto que têm sobre os que nos cercam. Assim, ter a possibilidade de fazer o bem e não fazê-lo é tão terrível quanto fazer o mal. No entanto, para decidir pensando também nos outros, é necessária a convicção de irmandade, que é capaz de fazer brotar do fundo da alma um sentimento de corresponsabilidade.

Assumir essa irmandade não é invadir a privacidade ou interferir no livre-arbítrio de alguém, mas assumir uma postura de proteção aos outros em cada decisão que tomamos. No caso do comércio de bebida alcoólica para crianças e adolescentes isso significa decidir não vender, assim como quem nega uma tesoura afiada a uma criança pequena. É a convicção do risco e a atitude protetora que fazem com que um adulto responsável não pense em ceder ao choro, às reclamações ou à cara feia da criança que, de mãos estendidas, pede a tesoura.

É claro que há um preço para assumir a irmandade. Sempre há. Para os comerciantes é a redução dos lucros. Não é uma questão simples para quem vive de comprar e vender. No entanto, para manter intacta a consciência e exercer a irmandade, alguns têm-se contentado em ganhar menos e outros até deixaram seus negócios com bebida para buscar outras atividades. São decisões corajosas, mas sobretudo cheias de convicção de que decidir pelo que é certo sempre vale a pena e de que o bem comum é sempre preferível ao lucro manchado com o sofrimento alheio.

A alegria do maior São João do mundo não deveria arriscar o futuro de nossas crianças e adolescentes! O riso de uma geração não deveria custar o choro da seguinte! A pergunta, então, continua no ar, como a nos provocar: onde está o teu irmão? O que é feito do garoto a quem foi vendida mais uma dose? Onde foi parar a garota risonha na mão de quem foi colocado mais um copo cheio? Não somos, por acaso, nós, os protetores dos nossos irmãos?

23 junho 2012

Teologia e pedagogia - sob a ótica da graça e cruz


Síntese do texto "Teologia e pedagogia - sob a ótica da “graça e cruz”: desafios para uma pastoral", escrito por Manfredo Carlos Wachs. Produzido dentro dos limites de forma exigidos pela EST - Escola Superior de Teologia como requisito da disciplina Relação Teologia e Pedagogia.

Introdução
De início o autor rejeita o mero contato entre teologia e pedagogia e sugere o estabelecimento de um espaço de influência mútua em prol de uma reconstrução. Apela para Sinner, Zabatiero, Mueller e Amélia Franco para definir teo-pedagogizar como o exercício de teorizar e concretizar uma práxis educativa que fale de Deus.

Dimensão interdisciplinar

O autor recorre à história para advogar a tese de que aquilo que hoje consideramos interdisciplinaridade fazia parte natural da forma de pensar anterior à fragmentação do conhecimento, ocorrida durante a modernidade. Por isso, veem-se nos escritos de antigos teólogos a teologia e a pedagogia a fazer parte de uma só reflexão. Afirma, no entanto, que mesmo depois da fragmentação é possível identificar pensadores resistentes a ela e favoráveis à unidade do pensamento humano e destaca Comenius como um representante desse pensamento. Comenius é contraposto a Descartes, apontando-se que a história optou pelo segundo e não pelo primeiro.

Em busca de fundamentar o tópico, o texto apresenta Fraas, Browning, Freire e Gutiérrez como teólogos e pedagogos partindo de um chão comum para desenvolver suas ideias: Fraas liga a fé aos fenômenos da vida e Browning propõe a correlação entre as questões sobre a experiência cotidiana e o testemunho cristão; Freire e Gutiérrez fazem algo parecido, ambos estabelecem uma hermenêutica “a partir de alguém e não para alguém” e assim teorizam começando por um contexto histórico localizado. Defende o autor, então, com vistas à teo-pedagogia, o “pensar em conjunto” ao invés de “buscar consensos”.

Com base no conceito freireano da incompletude, o autor desafia a teologia a revestir-se de humildade e respeito em seu processo de ensino, haja vista as limitações inerentes à compreensão e interpretação da verdade. A isso, junta o autor, encorajamento para compreensão da jornada de fé como um processo de aprendizagem que não está restrito e nem encontra seu ápice nos espaços e programas religiosos.

Desafios de uma teologia luterana no diálogo de uma teo-pedagogia

De forma a tornar prática sua proposta, o autor parte de certas dimensões teológicas e tenta pensar pedagogicamente sobre essas abordagens.

Assim, a encarnação e a vivência infantil de Jesus (que confrontaram o pensamento greco-romano sobre o valor das crianças), podem conduzir ao compromisso de agir em prol da inclusão de todas as crianças em um processo educacional redentor; a justificação por graça e fé (que confronta a justiça própria e autossuficiência), pode motivar à gratidão pelos recursos e auxílios recebidos na caminhada de estudo.

A dimensão da cruz (que transforma morte em vida em inequívoca e incondicional manifestação do amor de Deus em favor da humanidade) aponta para o acolhimento de todas as pessoas no contexto do processo de ensino-aprendizagem, no qual deixam de existir restrições quanto ao potencial de resposta e passa a vigorar a aceitação e respeito em decorrência do amor já revelado por Deus.

A gratuidade da redenção oferecida por Cristo (que confronta o pensamento humano baseado em mérito/merecimento) desafia a estabelecer no contexto das iniciativas e atividades pastorais relacionamentos generosos que não retém o que podem fazer em prol das pessoas nem manipulam estabelecendo moedas de troca ou permuta de favores.

Contribuição da hermenêutica ricoeuriana

Duas abordagens apresentada por Paul Ricoeur em sua hermenêutica são destacadas pela contribuição que podem oferecer ao pensar teo-pedagógico: os símbolos e a prospecção.

Afirma o autor que, segundo Ricoeur, é na multiplicidade dos símbolos que encontramos a plena revelação de Deus. De per si, cada símbolo revela e esconde, assim ao observar os diversos símbolos pode-se apreender mais que se concentrando em apenas um: não apenas a cruz, mas também a manjedoura, o vale dos leprosos e a sombra da. Pensa o autor que isso deve nos levar a incorporar à prática educacional o entendimento de que Deus não está preso aos limites religiosas que nós estabelecemos e que por isso as pessoas devem ser ajudadas dentro das fronteiras religiosas em que se encontram.

O texto continua apresentando o “olhar para o futuro” (prospecção em Ricoeur) como chave interpretativa da realidade. Ao invés de olhar saudosamente para o passado ou para dentro de si, entende o autor que Ricoeur nos desafia olhar para as utopias como dignas de serem buscadas. No entanto, o autor utiliza um parágrafo extenso para ressalvar a importância de um olhar retrospectivo sobre a cruz de Cisto, inclusive como fato histórico, e sua necessidade para questionar quem somos, o que fazemos, qual nossa contribuição e assim (re)significar o futuro. Entende o autor que essa reflexão é útil a partir do desafio de produzir indagações que questionem o futuro da prática educativa à luz de sua história e de sua efetiva contribuição para a transformação da realidade.

Uma contribuição da pedagogia freireana

Finaliza o autor os desafios a uma pastoral apresentando duas categorias do pensamento de Paulo Freire: Dialogicidade e a Tríade antropológica.

Freire compreende o diálogo como pertinente à diversidade, mas não ao antagonismo. Para ele não se trata de uma técnica, mas uma atitude de vida pautada no entendimento de todos são detentores de saberes. Esse diálogo, portanto, desafia nossas próprias verdades e valoriza o relacionamento entre os diferentes. Pensa o autor que essa contribuição de Freire favorece ao diálogo inter-religioso, bem como leva ao entendimento de que há saberes a serem aprendidos em outras comunidades religiosas, nas tradições populares e junto às lideranças locais. A disposição para ouvir será recompensada com a disposição do outro de ouvi-lo. Quanto à tríade antropológica (fé, esperança e amor), entende o autor que deve permear toda a prática educativa no contexto das pastorais, ao nos deixarmos contaminar pela esperança e amor do próprio Deus.