10 janeiro 2011

Dilma manda tirar Bíblia e crucifixo do gabinete


Em sua primeira semana no Palácio do Planalto, a presidente Dilma Rousseff (foto) mandou tirar do seu gabinete a Bíblia e o crucifixo, o que, talvez, tenha sido a primeira vez que isso ali ocorre. Esse gesto pode ter várias interpretações, entre as quais a sinalização de que ela não aceitará em seu governo a ingerência de religiões e religiosos. O que não houve em sua campanha eleitoral, quando teve de se aproximar de líderes evangélicos e católicos para tentar convencê-los de que não vai se empenhar para a legalização do aborto.
Durante o vale-tudo da campanha, evangélicos acusaram Dilma de ser ateia, o que ela nunca admitiu. Mas certeza mudou o seu senso de religiosidade, ao menos de boca para fora, para não perder parte dos votos que herdou do Lula.
Em 2007, em entrevista à Folha de S.Paulo, ela afirmou ter ficado “durante muito tempo meio descrente”. Em abril de 2010, já em campanha, lembrou ter sido criada no catolicismo e que acreditava em uma força superior. “Estudei em colégio de freira. Sou católica.”
Em um dos seus discursos de posse, Dilma reafirmou o compromisso com a liberdade religiosa, o que seria desnecessário dizer, porque está previsto na Constituição.
A rigor, independente da crença ou descrença de Dilma, a Bíblia, o crucifixo e demais símbolos religiosos deveriam ser retirados não só do gabinete presidencial, mas de todas as repartições públicas, porque o Estado é laico. Também está na Constituição.

Vander: inspiração em Bebeto, fé e vontade de vencer no Fla



Jovem, franzino, baiano. As semelhanças, por enquanto, param por aí. Mas Vander, reforço do Flamengo para a nova temporada, já escolheu sua inspiração: o ex-atacante Bebeto. Assim como o novo meia rubro-negro, o tetracampeão deixou a Bahia para jogar na Gávea. Em 1983, Zico logo se transferiu para a Itália, e Júnior seguiu o mesmo caminho no ano seguinte. O início não foi tão fácil, com algumas derrotas e frustrações. Entretanto, em 1987, ele ganhou o coração da torcida.
- Ele me inspira, foi jogador que saiu do Vitória, veio para o Flamengo e hoje é quem é. Serve de inspiração para mim. Se pudesse falar com ele, seria bom. Foi um cara vitorioso no Flamengo e quero seguir a trajetória dele - disse, em sua primeira entrevista como jogador do Fla.
Aos 20 anos, Vander foi revelado pelo Bahia. Saiu do bairro São Marcos, na periferia de Salvador, chegou ao Tricolor aos 11 anos e desde então “vem na batalha”. Foi promovido a profissional na temporada passada. A tatuagem na nuca demonstra a fé do jogador: “Meu bom Deus, me conceda amor e paz”. Emprestado ao Fla até o fim deste ano, quer aproveitar a chance da carreira.
- A ficha não caiu ainda. Foi tudo muito rápido. Estava em Salvador quando recebi a informação de que a chance de chegar ao Flamengo seria grande. Em dois dias aconteceu. Aos poucos estou me acostumando a jogar aqui. Consegui ajudar o Bahia a voltar para a Série A, fiz gols, dei algumas assistências. O Renato (Gaúcho, hoje no Grêmio) foi o técnico que me deu a chance de subir - lembrou.
Em Londrina-PR, cidade escolhida pelo Fla para realizar a pré-temporada até o próximo dia 17, Vander se impressionou com a estrutura disponível para o Rubro-Negro. Aos poucos, tenta se acostumar com a rotina de um clube de maior expressão.
- O trabalho está sendo diferente. Vai ser bom para mim. Tenho trabalhado forte para poder ter disposição para todo o ano - comentou.
Para quem ainda não teve a chance de ver Vander em ação, ele se apresenta.

- Sou meia ou segundo atacante, mas jogo pelas laterais. Sou individualista e também finalizo bem - definiu-se.

08 janeiro 2011

Cantar a Bíblia


8 de Janeiro, 2011
Por Filipa Moroso (texto) e Helena Garcia (fotografias)
 Descobrimos o canto gregoriano no Concerto de Natal que esgotou o Salão Nobre da Academia de Ciências de Lisboa. A Capela Gregoriana Laus Deo e o Coro Solemnis foram as vozes que chegaram aos céus, num espectáculo de indiscutível prazer auditivo...
«Quem canta bem, reza duas vezes». O adágio tem origem nas palavras de Santo Agostinho ('Quia bene canta, bis ora' ) e remete para a principal mensagem do canto gregorariano: orar a Deus. Uma oração cantada por vozes em uníssono que, entre sons agudos e graves, pretende difundir uma mensagem espiritual, quase sempre em latim, em que o texto tem que ter primazia face à melodia.

Foi assim no Salão Nobre da Academia de Ciências de Lisboa, que reatou a tradição antiquíssima de abrir as portas ao público, fechadas já há longos anos. Foi aí que conhecemos dois dos grupos com maior tradição gregoriana em Lisboa, a Capela Gregoriana Laus Deo e o Coro Solemnis. Evocar a época natalícia foi o mote deste concerto de Natal, que aconteceu a 11 de Dezembro num dos mais imponentes salões barrocos do país, datado de 1795. Fomos assistir aos ensaios.



«Esta sala tem uma acústica espectacular, tem tudo para que corra bem». O prognóstico da maestrina Idalete Giga foi feito minutos antes de embalar as vozes para o aquecimento. É a ela que cabe a responsabilidade artística da Capela Gregoriana Laus Deo, nome em latim que significa Louvor a Deus e que vinha sempre no fim «dos autos religiosos de Gil Vicente».

Composto por 20 mulheres, a maioria antigas alunas do Instituto São Pedro de Alcântara, em Lisboa, este coro nasceu em 1985, pelas mãos de Idalete, que estudou canto gregoriano, pedagogia musical Ward e Helden, direcção gregoriana e polifónica com vários mestres, entre os quais Júlia d'Almendra. A maestrina confirma a mestria de tais credenciais com a batuta. É exigente e as suas 'meninas', algumas já reformadas, sabem disso. De fatos pretos, com blusa e laço ou outro apontamento em branco, o Laus Deo ocupava a linha da frente de um palco a duas vozes, femininas e masculinas, que descortinava as coordenadas de Idalete, numa linguagem que só os próprios conhecem.

As vozes viris faziam-se ouvir atrás. O coro Solemnis ('solene' do latim), fundado em 1997 e comandado pelo maestro João Crisóstomo, antigo professor do Conservatório Nacional e com formação musical na Escola Superior de Música, é constituído por 12 elementos masculinos, antigos alunos dos seminários religiosos com larga experiência na arte do canto gregoriano, quer na sua vertente musical, quer na língua latina - «já que o latim é essencial para esta forma de canto», como diz o maestro. E aqui é preciso compreender-se o que se está a cantar para que se transmita 'alma' às melodias espirituais, com um indubitável prazer estético e auditivo.

Conhecida como a mais antiga manifestação musical do Ocidente, o canto gregoriano acompanhou, desde a Idade Média até aos nossos dias, o culto religioso das igrejas cristãs, sobretudo as liturgias da Igreja Católica Romana. Deve o seu nome ao Papa Gregório Magno, que deu grande desenvolvimento a esta forma de cantar as preces.
Cantado a capela, ou seja, sem acompanhamento de instrumentos, as letras que dão forma ao canto gregoriano são retiradas de textos bíblicos, sobretudo dos salmos. O seu maior objectivo é propagar a fé e não fazer um recital, daí que seja entoado com alma e sentimento, com a missão de chegar à assembleia ouvinte.


«Sempre associado ao homem», sublinha Idalete Giga, este canto de ritmo livre e sem compasso , depressa começou a ser entoado por vozes femininas. Se o único segredo para o cantar bem é a devoção, elas provam que têm a espiritualidade necessária para 'cantar a Bíblia'.

O Salão Nobre da Academia das Ciências de Lisboa foi testemunha desta 'batalha' de vozes, em que venceu o conjunto. A acústica da sala foi perfeita, como fazia prever o prognóstico de Idalete. Mais uma vez juntos - «já fizemos inúmeros concertos em conjunto»-, Laus Deo e Solemnis falaram a mesma língua. Uma linguagem própria que se decifra nos signos da Cristandade, uma sonoridade com enorme expressão, validada por vozes crentes. Que venham outros natais cantados...

filipa.moroso@sol.pt