Quem é o meu próximo?
Boa noite, irmãos e irmãs! Este é o nosso penúltimo
encontro nesta série de pregações sobre o autêntico evangelho de Jesus. Até
agora vimos que o evangelho está guardado sob algumas falas importantes de
Jesus. Ele disse:
Eu vim para que tenham vida.
Eu vos aliviarei.
Sem mim nada podeis fazer.
Amai-vos com eu vos amei.
Hoje vamos nos deter no diálogo de Jesus com um
intérprete da lei, um homem que gastava muito do seu tempo lendo, estudando e
meditando nas Escrituras. Desse diálogo espero que possamos extrair mais um
aspecto das boas novas anunciadas por Jesus.
Na conversa que teve com aquele estudioso, Jesus contou
a história de um homem que viajava de Jerusalém para Jericó. Era uma viagem
perigosa, descendo a serra, com caminhos estreitos e tortuosos.
Desde que Jesus a contou, essa história tem sido
recontada, cantada, pintada e dramatizada repetidas vezes pelas gerações seguintes
de seus seguidores. Grandes mestres da pintura já retrataram algumas de suas
cenas, tentando capturar a força das palavras ditas pelo nosso Senhor.
Eu trouxe uma animação para nos lembrar qual é a
história. Vamos ver.
Vejamos agora toda a história, conforme foi registrada
no evangelho de Lucas:
25Certa ocasião, um perito na lei
levantou-se para pôr Jesus à prova e lhe perguntou: "Mestre, o que preciso
fazer para herdar a vida eterna?"
26"O que está escrito na Lei?",
respondeu Jesus. "Como você a lê?"
27Ele respondeu: " ‘Ame o Senhor, o
seu Deus, de todo o seu coração, de toda a sua
alma, de todas as suas forças e de todo o seu entendimento’ e ‘Ame o seu
próximo como a si mesmo’".
28Disse Jesus: "Você respondeu
corretamente. Faça isso, e viverá".
29Mas ele, querendo justificar-se,
perguntou a Jesus: "E quem é o meu próximo?"
30Em resposta, disse Jesus: "Um homem
descia de Jerusalém para Jericó, quando caiu nas mãos de assaltantes. Estes lhe
tiraram as roupas, espancaram-no e se foram, deixando-o quase morto.
31Aconteceu estar descendo pela mesma
estrada um sacerdote. Quando viu o homem, passou pelo outro lado.32E assim também um levita; quando chegou ao lugar e o
viu, passou pelo outro lado.
33Mas um samaritano, estando de viagem,
chegou onde se encontrava o homem e, quando o viu, teve piedade dele.34Aproximou-se, enfaixou-lhe as feridas, derramando
nelas vinho e óleo. Depois colocou-o sobre o seu próprio animal, levou-o para
uma hospedaria e cuidou dele.
35No dia seguinte, deu dois denários ao
hospedeiro e disse-lhe: ‘Cuide dele. Quando voltar lhe pagarei todas as
despesas que você tiver’.
36"Qual destes três você acha que foi
o próximo do homem que caiu nas mãos dos assaltantes? "
37 "Aquele que teve misericórdia dele",
respondeu o perito na lei. Jesus lhe disse: "Vá e faça o mesmo". Lc 10. 25-37
Tudo começa com a tentativa de fazer uma pegadinha
teológica com Jesus. De tanto estudar as Escrituras, aquele homem tornou-se um
perito da lei. Nada havia escapado ao seu exame dedicado e meticuloso. Ele
então, resolveu testar os conhecimentos de Jesus. Será que aquele jovem galileu
tinha feito a lição de casa e estudado direitinho todos os ensinamentos das
Escrituras Sagradas?
A pergunta feita foi sobre um tema muito polêmico nos
dias de Jesus: a vida eterna. O que era preciso fazer para herdá-la? O
estudioso da lei estava pronto para um grande debate teológico! Finalmente ele
encontrara alguém à altura dos seus conhecimentos sobre as Escrituras. Quando
terminou de perguntar, todos os olhos se voltaram para Jesus. Como seria a
resposta dele?
Conheci
um homem que era um estudioso muito detalhista da Bíblia. Ele era muito correto
no seu procedimento e tinha um caderninho em que anotava suas dúvidas sobre os
textos bíblicos. Sempre que alguém tentava conversar sobre a fé em Jesus e vida
de relacionamento com o Senhor ele desconversava e acabava falando sobre o
caderninho. Ele achava que para andar com Jesus era preciso resolver todas as
dúvidas sobre as Escrituras. Em uma de nossas conversas eu lhe disse: “Quem já
tem certeza não precisa de fé. A fé é a marca daqueles que não têm certeza, mas
confiam.”.
Voltando a nossa história, Jesus não entrou no debate.
A resposta dele foi uma pergunta: o que está escrito? Como você entende o texto
sagrado? Não é interessante isso? Jesus poderia fazer uma bela e profunda
exposição dos textos sagrados, mas não o fez. Ele poderia sair dali aplaudido
como um profundo conhecedor da lei, mas não o fez. Ele preferiu dialogar. Por quê.
Penso que Jesus fez isso porque não era o debate das
ideias ou a vitória do argumento que lhe interessava naquele momento. Diante
dele havia uma pessoa que precisava descobrir mais sobre como viver o amor de
Deus. Jesus estava mais interessado em facilitar essa descoberta.
A
melhor maneira de facilitar a descoberta do amor de Deus é dialogar: ouvir,
refletir, falar, refletir, ouvir, refletir... Vejo muito crente sedento por
debates e discussões nas redes sociais. Muitas argumentações, grosseria,
xingamento, desrespeito e pouquíssimo diálogo. É preciso repensar a forma como
nos relacionamos nesses ambientes virtuais! Ninguém é obrigado a pensar ou crer
exatamente como nós. Jesus sempre optou pelo diálogo para alcançar o coração
das pessoas.
O perito da lei
sabia a resposta; perguntou o que sabia apenas para ficar mais à vontade no
debate. Ele foi direto ao ponto: amar a Deus e amar ao próximo. Jesus, então
disse: isso mesmo! Você está certo faça isso e viverá.
Até agora, o perito estava apenas estudando a lei,
pensando sobre o que é certo e o que é errado, refletindo sobre qual o melhor
caminho. Jesus, então, como um mestre cuidadoso, segurou na mão daquele homem e
o convidou a dar um passo a mais: faça isso e viverá!
É assim o autêntico evangelho de Jesus! Ele vai além
da simples reflexão, ultrapassa os estudos dedicados. O evangelho é mais que o
um conjunto de regras e não se contenta apenas em saber o que é certo. O
evangelho autêntico de Jesus nos chama experimentar a verdade em nossas
próprias vidas.
Muitos
de nós, que frequentamos as igrejas, nos acostumamos a apenas saber o que é
certo. Quando é que você vai segurar na mão de Jesus e fazer o que já sabe que
é certo? Ouvimos sobre perdão, mas não perdoamos. Entendemos a graça de Deus,
mas continuamos tentando nos salvar a nós mesmo. Ouvimos sobre misericórdia,
mas somos cruéis. Aprendemos sobre paz, mas vivemos em guerra com as pessoas.
Choramos diante do sacrifício de Jesus não cruz, mas somos incapazes de pagar o
preço necessário para manter a família unida, sustentar uma amizade antiga, ser
fiel à esposa, ou sustentar o testemunho de Cristo no trabalho. Até quando
irmãos, vamos viver assim?
Nossa história continua de forma bem interessante. Era
de se esperar que o perito da lei se desse por satisfeito. Afinal de contas ele
perguntou e Jesus confirmou que o entendimento que ele tinha da lei estava
correto: a vida eterna é a herança daqueles que amam a Deus com todo seu
coração, alma, forças e entendimento e amam ao próximo como a si mesmos.
No entanto, o estudioso das Escrituras não se
contentou. Por quê? Primeiro, porque o debate que não aconteceu como ele
imaginava: Jesus o transformou em um diálogo; segundo, porque se tudo terminasse
ali ele sairia com um grande desafio prático: faze isso e viverá.
Nos jogos de computador ou no celular, todo mundo quer
passar de fase. Tem gente que vira a noite até passar para fase seguinte do seu
jogo preferido. Ali, de frente com o desafio de avançar e colocar sua fé em
prática, aquele homem, crente nas Escrituras, não queria passar de fase. Então,
ele fez uma pergunta, como quem derruba propositalmente uma árvore no meio da
estrada em que está caminhando, e parou novamente: quem é o meu próximo?
Ainda
hoje, meus irmãos, muitos de nós que somos da fé, fazemos a mesma coisa. Quando
o evangelho nos alcança e nos convoca para viver a vida, colocamos obstáculos
no meio da estrada. Quais são as suas árvores? O que impede você de abraçar o
autêntico evangelho de Jesus? Quais são as coisas que primeiro você vai
resolver para só então passar de fase? Por quanto tempo mais você vai
permanecer apenas ouvinte do evangelho de Jesus? Não é a hora de fazer o que
você já sabe ser certo?
Nossa história é um alento, um consolo para nossa
caminhada com Cristo. Ela mostra como Jesus é realmente um mestre paciente e
perseverante. Veja só:
Para ajudar o perito da lei a passar de fase, ele
contou a história de um viajante que saiu de Jerusalém para Jericó. Todo mundo
sabia que esse era um caminho perigoso. Uma descida de serra, cheia de curvas e
voltas onde os assaltantes poderiam se esconder e com facilidade tomar de
assalto quem por ali fosse passando. E foi exatamente isso o que aconteceu com
o viajante da história. O homem foi roubado, espancado e deixado quase morto na
beira da estrada.
Jesus continuou dizendo que outros dois homens
passaram pela mesma estrada logo em seguida: um sacerdote e um levita. Os dois
eram pessoas de fé e muito religiosas. Eles participavam diretamente do culto a
Deus, por isso ambos eram tidos como pessoas que caminhavam perto de Deus.
Todos que ouviam a história esperavam que tanto o
sacerdote quanto o levita socorressem aquele homem. Era o mínimo que se
esperava deles: que o fato de eles serem pessoas tão próximas de Deus
produzisse neles compaixão por aquele homem caído. Mas não foi isso que
aconteceu. Os dois mudaram de calçada.
Nesse ponto da história, todos estavam em suspense. E
agora? Se o sacerdote e o levita, pessoas de Deus, não pararam para ajudar,
certamente este homem vai morrer ali na beira da estrada.
Jesus, no entanto, continuou a história. Um terceiro
homem caminhava pela mesma estrada naquele dia: um estrangeiro da região de
Samaria. Quando Jesus falou isso, todo mundo que estava ouvindo a história
torceu o nariz (coçou a cabeça, mudou o lado que estava sentado...), porque
havia uma disputa antiga entre os judeus e os samaritanos. Uma briga de família
mal resolvida.
Claro que o samaritano ia passar direto! Se o pastor e
o ministro de louvor passaram reto... aquele rapaz da renovação carismática
católica não ia parar. Aliás, alguns deles estavam já torcendo para o
samaritano passar direto. Nem se lembravam mais do sofrimento daquele homem, jogado
na beira da estrada para morrer.
O samaritano também viu o homem ferido e gemendo. A
história então, toma uma direção surpreendente. Ele olhou para o homem caído e
encheu-se de compaixão diante do estado em que ele se encontrava. Interrompeu
sua viagem, desceu de sua montaria, tratou e enfaixou as feridas do viajante, o
pôs sobre seu próprio animal e o levou para uma pousada. Lá, ele passou a noite
cuidando daquele desconhecido, para no dia seguinte prosseguir em sua viagem.
Mais que isso, o homem de Samaria, ao sair, pediu que o dono da pousada
continuasse cuidado do viajante desconhecido e se responsabilizou por todas as
despesas.
A essa altura todos que ouviam a história, inclusive o
perito da lei, estavam de boca aberta. O homem de Samaria, que não adorava Deus
do jeito certo, que não sabia tudo o que era necessário a respeito de Deus,
cuja família desde muitas gerações não acreditava em coisas errada a respeito
de Deus, foram o único a fazer aquilo que todos sabiam ser a coisa certa a ser
feita.
Precisamos
reconhecer, meus irmãos, que o mero conhecimento das Escrituras não significa
muita coisa se não houver também transformações em nossa maneira de viver. A
mera participação em cultos e programações, que falam sobre o evangelho de
Jesus, não tem muito valor se nossas atitudes para com as pessoas próximas de
nós forem de amor e misericórdia. O autêntico evangelho de Jesus não pode ser
plenamente vivido sem que você perceba as dores e o sofrimento daqueles que
Deus colocar em seu caminho.
Vamos lembrar que a pergunta do perito da lei, aquele
tronco que ele jogou meio da estrada para não avançar, era “Quem é o meu
próximo”, isto é, quem eu devo amar. A pergunta do perito é sutil, porque
pressupõe que nem todas as pessoas devem ser amadas, porque nem todas estão
próximas. Então como eu saberei quem é o próximo que eu devo amar?
O perito da lei e todos que ouviam a história de Jesus
estão prontos para sua conclusão. Ele a queriam ouvia da boca do jovem
pregador. Quem é afinal o próximo a quem devo amar.
Então Jesus outra vez faz uma pergunta: “Qual destes
três você acha que foi o próximo do homem que caiu nas mãos dos assaltantes? ”.
Vejam como Jesus muda a direção da conversa: o perito queria saber quem era o
seu próximo, Jesus pergunta que se fez próximo do viajante na estrada; o mestre
da lei queria saber quem ele deveria amar, Jesus pergunta quem amou; para o
estudante das escrituras o importante era quem está próximo de mim o suficiente
para que eu ame, para Jesus o que importava de quem você vai se aproximar para
amar.
Qual deste três se aproximou do viajante assaltado,
perguntou Jesus. Qual deles se fez próximo daquele homem e o amou não só da
boca pra fora? O perito na lei não fugiu da pergunta: “aquele que teve
misericórdia dele”.
Temos
aqui uma vocação, um chamado do autêntico evangelho para todos os seguidores de
Jesus: fazer-se próximo das pessoas para amá-las de fato e em verdade. Os
seguidores de Jesus fazem como ele: não esperam que as pessoas se aproximem
para amá-las, aproximam-se das pessoas para que possam amá-las.
Fazendo
assim estamos imitando nosso Senhor e Salvador, Jesus Cristo, que deixou a
eternidade e se fez humano. Sentiu nossas dores, viveu nossas angústias e
experimentou os nossos medos, para que seu amor por nós fosse completo. Ele se
fez próximo de nós e nos chama para que nos façamos próximos daqueles que
cruzam nosso caminho.
Começamos com a pergunta do perito da lei, “Quem é o meu próximo” e chegamos à
pergunta de Jesus “De quem você vai se
fazer próximo? ” A primeira pergunta é um tronco no meio da estrada, a
segunda é caminho livre para passar de fase e experimentar o autêntico
evangelho de Jesus. Que ele nos ajude na caminhada.