10 dezembro 2017

Natal do nosso jeito



Natal do nosso jeito

Hoje teremos a oportunidade de conhecer melhor alguns dos símbolos e tradições presentes no Natal. Talvez você se surpreenda com a origem de vários deles e pode ser até que fique um pouco desconcertado com seus significados mais antigos. Então peço que seja paciente e percorra esse caminho passo-a-passo, porque o caminho pode ser espinhoso mas pretendo levá-lo a pastos verdejantes e a águas tranquilas.

Para começar, talvez seja importante dizer que o Natal como conhecemos hoje é uma coleção de símbolos e tradições de diversas épocas e culturas. Dentro dessa panela tem coisas bem diferentes umas das outras como árvores, sinos, estrelas, anjos e manjedouras. Esses símbolos e tradições foram colecionados e costurados como uma colcha de retalhos.

Se fosse como a colcha com retalhos que a irmã Guiomar fez seria ótimo! Mas a costura desses símbolos e tradições resultou em uma cultura natalina nem sempre harmoniosa e agradável como é aquela linda colcha da irmã Guiomar.

A Data

Vamos começar pela data. Na maior parte do mundo ocidental o natal é festejado em dezembro, no dia 25. Já no oriente a igreja cristã ortodoxa celebra no dia 7 de janeiro. Mas não há como saber através das narrativas bíblicas o dia exato do nascimento de Jesus. Nem juntando os relatos dos quatro evangelhos teríamos como chegar a uma resposta. No entanto, uma coisa podemos afirmar sobre a data, não foi em dezembro. A conclusão decorre de Lc. 2.8,9.

Havia pastores que estavam nos campos próximos e durante a noite tomavam conta dos seus rebanhos. E aconteceu que um anjo do Senhor apareceu-lhes e a glória do Senhor resplandeceu ao redor deles; e ficaram aterrorizados. Lc 2.8,9 (NVI)

A questão é que em dezembro é inverno no hemisfério norte e faz muito frio. Lídia, nossa filha mais velha, enviou imagens de neve na cidade onde ela mora, no sul dos EUA. Faz dez anos desde a última vez que nevou por aquelas bandas. Na região em que Jesus nasceu o frio no inverno é insuportável para as pessoas e para os animais, então dificilmente os pastores de ovelhas estariam nos campos cuidando de seus rebanhos.

A fixação da data em 25 de dezembro ocorreu por volta do século IV. Nessa época houve uma conversão em massa ao cristianismo, por imposição do imperador romano. Lotada de novos crentes, a igreja então deparou-se com um problema: o que fazer com as grandes e tradicionais festas que eram realizadas em dezembro, como a Saturnália (em homenagem ao deus Saturno) e as celebrações do solstício de inverno (a festa do sol)?

 Nessa época do ano, é quando, no hemisfério norte, acontece a noite mais longa do ano, usada para marcar o início do inverno. A partir desse dia as noites vão se tornando mais curtas e os dias mais longos, o que era motivo de alegria e celebração, porque era um sinal de que o rigor do inverno iria pouco a pouco diminuir.

Assim, num esforço para lidar com essa situação, os líderes cristãos apresentaram uma nova razão para os festejos de final de ano: em vez de cultuar a Saturno ou ao Sol Vitorioso que iria vencer a luta contra o inverno, o povo foi chamado a cultuar a Jesus, o sol da justiça e luz do mundo.

A Disputa

Alguns acharam que não foi uma boa coisa o que foi feito, porque aquelas conversões aconteceram por decreto do imperador, de maneira que não havia muita gente disposta a mudar sincera e espontaneamente suas crenças e deixar de adorar seus deuses para adorar a Jesus. Outros pensaram que mesmo assim foi algo bom, porque a igreja ofereceu às pessoas o motivo certo para adoração em vez simplesmente deixá-las enredadas em seu engano.

O entendimento dessa origem tensa das celebrações de final de ano talvez seja suficiente para nos ajudar a compreender a mistura de símbolos e tradições que acontece nessa data. De um lado, temos elementos ligados às festas pagãs antigas que foram resignificados pela igreja; de outro, há os elementos ligados à narrativa bíblica encontrada nos evangelhos. Juntaram-se ainda a isso tudo, algumas tradições que foram-se formando com o decorrer do tempo, sem ligação com as festas pagãs, e também outras de caráter meramente mercantilista. Formou-se então a colcha de retalhos sobre a qual havia falado antes (que nem de perto é parecida com a colcha feita pela irmã Guiomar.

SÍMBOLOS E TRADIÇÕES

Deixe-me agora tratar de alguns símbolos e tradições natalinas. Como há muitos, escolhi apenas alguns. Em outra ocasião podemos fazer um estudo detalhado a respeito de cada um.

Árvore de Natal

Talvez seja um dos ícones mais presentes atualmente no natal. A tradição de usar árvores como símbolos é bem antiga. Os egípcios, bem antes de Jesus, já usavam galhos verdes de palmeira dentro de suas casas. Os povos indo-europeus árvores como símbolo da vida e os Druidas tinham o costume de decorar velhos carvalhos para suas festas religiosas. Há várias versões sobre como surgiu a “Árvores de Natal”:

(1) alguns comentaristas apontam para o século VIII na Alemanha, quando S. Bonifácio teria proposto a substituição dos carvalhos (que secam durante o inverno e eram dedicados ao deus Odin) por um pinheiro (sempre verde no inverno e oferecido a Jesus);
(2) outros afirmam que o costume foi adotado pelos cristãos também na Alemanha, mas no século XVI, quando as famílias começaram a decorar árvores com papel colorido, frutas e doces;
(3) há também quem apoie que nessa mesma época Martinho Lutero, impressionado com pinheiros cheios de neve debaixo de um céu estrelado, reproduziu a cena em sua casa com galhos e velas.
A tradição chegou à Inglaterra, França e Estados Unidos no século XIX e apenas no século XX foi abraçada pelos países da américa latina.

Não há uma ligação direta entre a árvore de Natal e o natal de Jesus. No esforço de dar novo significado a costumes antigos considera, a árvore de natal, toda verde, como sinal da vida que está em Jesus, a estrela no topo foi identificada com a estrela de Belém, enquanto as bolas nela penduradas significam os bons frutos oferecidos por Jesus à Humanidade. Já as velas ou luzes representam a presença de Cristo como Luz que ilumina o caminho dos homens e aquece os nossos corações.

Papai Noel

Quanto ao Papai Noel, embora seja incerta, a história mais comum entre os pesquisadores é que a ideia de um velhinho bondoso que trás presentes na época de natal venha do século IV e seja inspirada em Nicolas (Nicolau). Conta-se que seus pais tiveram dificuldades para ter filhos, até que nasceu Nicolas. Dando graças pelo fato, eles passaram a distribuir alimentos, roupas e dinheiro aos pobres, até que vieram a falecer devido a uma epidemia.

Nicolas herda a grande fortuna de seus pais, torna-se bispo de Myra, na Ásia Menor, e continua o trabalho de ajuda aos necessitados. Ele viveu na época do Imperador Diocleciano, em Roma.

Até o final do século XIX, o Papai Noel era representado com uma roupa de inverno na cor marrom ou verde escura. Em 1886, um cartunista alemão criou uma nova imagem para o bom velhinho. A roupa nas cores vermelha e branca, com cinto preto foi apresentada em uma revista semanal mesmo ano. Em 1931, uma campanha publicitária da Coca-Cola mostrou o Papai Noel com o mesmo figurino criado pelo cartunista, que com as mesmas cores do refrigerante.

A bondade do velhinho certamente é um atrativo para essa época de festas, mas, exceto por haver sido inspirado em um cristão bondoso, não há conexão entre ele o natal de Jesus. Em torno do Papai Noel há um conjunto de símbolos que nunca foram resignificados pelo cristianismo como renas, trenós, duendes e até uma mamãe noel.

Não há um esforço visível para dar ao Papai Noel um significado cristão. Possivelmente porque o universo em que ele vive não é um adereço ou um complemento, mas concorre diretamente com a narrativa bíblica, ao ponto de substituí-la.

Presépio

A palavra presépio refere-se o local onde o gado é colocado ao ser recolhido, isto é, ao curral. Ele parece ser de longe o símbolo natalino com mais conexões com o nascimento de Jesus, já que ele tenta mostrar a cena descrita nos evangelhos.

Segundo alguns pesquisadores a história do presépio remonta à Itália Medieval, lá pelo século 13. Foi nessa época que Francisco de Assis, fez uma pregação, em uma noite de Natal, acerca do nascimento de Jesus e decidiu montar um cenário. A encenação apresentava o menino Jesus, Maria, José e os reis em um presépio de palha rodeado por um boi e um. Um desses pesquisadores afirma que:

“O presépio de São Francisco de Assis (...) Foi uma maneira de ajudar a aproximar os fiéis, principalmente os analfabetos, que eram boa parte da população. Daí por diante, os presépios tornaram-se símbolos do cristianismo”.

Embora tenha cumprido um papel importante quando foi proposto por Francisco de Assis, três séculos depois o presépio foi rejeitado por alguns reformadores como imagens de escultura e idolatria. Essa rejeição certamente incomoda alguns cristãos ainda hoje e os faz não aderir aos presépios

Ainda há presépios grandes que são montados em algumas cidades mundo afora, e nas igrejas, mesmo nas evangélicas, a encenação do nascimento de Jesus tem espaço garantido nos cultos de natal. Mas a maioria dos presépios hoje são pequenos enfeites em que aparecem: o bebê Jesus, a manjedoura, os animais do estábulo, a estrela que apontou o lugar, os reis que levaram presentes, os anjos que anunciaram o nascimento, os pastores de ovelha que o visitaram e os pais do menino, Maria e José.

VIVENDO COM SABEDORIA

Bom, irmãos, nesse ponto é inevitável perguntar o que fazer com tudo isso? É possível convivermos e servirmos juntos ainda que pensemos diferente sobre essas questões. Deixe-me tentar ajudar. A base do meu entendimento sobre essa pergunta é o texto escrito aos irmãos da cidade de Roma, Rm 14. Vejamos:

1Aceitem o que é fraco na fé, sem discutir assuntos controvertidos. Um crê que pode comer de tudo; já outro, cuja fé é fraca, come apenas alimentos vegetais. Aquele que come de tudo não deve desprezar o que não come, e aquele que não come de tudo não deve condenar aquele que come, pois Deus o aceitou. Quem é você para julgar o servo alheio? É para o seu senhor que ele está em pé ou cai. E ficará em pé, pois o Senhor é capaz de o sustentar.
5Há quem considere um dia mais sagrado que outro; há quem considere iguais todos os dias. Cada um deve estar plenamente convicto em sua própria mente. Aquele que considera um dia como especial, para o Senhor assim o faz. Aquele que come carne, come para o Senhor, pois dá graças a Deus; e aquele que se abstém, para o Senhor se abstém, e dá graças a Deus. Pois nenhum de nós vive apenas para si, e nenhum de nós morre apenas para si. Se vivemos, vivemos para o Senhor; e, se morremos, morremos para o Senhor. Assim, quer vivamos, quer morramos, pertencemos ao Senhor.
22Assim, seja qual for o seu modo de crer a respeito destas coisas, que isso permaneça entre você e Deus. Feliz é o homem que não se condena naquilo que aprova. Mas aquele que tem dúvida é condenado se comer, porque não come com fé; e tudo o que não provém da fé é pecado.

Reconheço que alguns irmãos rejeitam o dia 25 de dezembro e todos os ícones natalinos e não desejam participar de festa alguma. Acham tudo no mínimo desnecessário e alguns até ofensivo. Eles certamente são livres em Cristo Jesus para pensar assim, porque não me parece ser essa uma questão doutrinária central ou relevante para nossa identidade como filhos de Deus. No entanto, Deus os chama a não condenarem aqueles que celebram o natal.

De outro lado, temos irmãos que se alegram nessa época pela oportunidade de anunciar com liberdade o motivo da festa, que o Salvador veio, e adornam suas casas de forma alusiva ao nascimento de Jesus. Esses também são livres para pensar e agir assim. No entanto, o Senhor os chama não desprezarem o entendimento e o desconforto de quem rejeita a festa e seus ícones.

No contexto coletivo, estou aqui assumindo o compromisso de lidarmos com equilíbrio e sabedoria, respeitando os pontos de vista individuais e trabalhando para que o amor de Deus encontre espaço para amarmos nossos irmãos ainda que pensemos diferente sobre um ou outro assunto periférico.


NA PLENITUDE DOS TEMPOS

“Mas pastor, se nem a data está certa e tem todas essas questões... Será que vale a pena? Não era melhor deixar tudo isso de lado?” É, eu sei que essas questões podem desanimar. Por isso, peço que você saia comigo um pouco da discussão sobre a festa do natal para nos concentrarmos no motivo da festa.

Mas, quando chegou o tempo estabelecido, Deus enviou-nos seu Filho, nascido de uma mulher, sob as condições da Lei, para redimir os que estavam sob o domínio da Lei. Assim, fomos libertados para sermos filhos que têm direito à herança. Uma vez que fomos adotados como filhos, Deus enviou o Espírito do seu Filho ao nosso coração, o que nos dá o privilégio de chamá-lo: “Papai!”. Essa intimidade com Deus é para vocês que são filhos, não para escravos. E, como filhos, são também herdeiros, com pleno acesso à herança. (Gl 4.4-7 AM)

Algumas traduções, falam sobre a “plenitude do tempo”. Isso é algo maravilhoso, gente! A despeito das questões em torno da data para comemorar o Natal, temos a garantia do texto bíblico de que o nascimento de Jesus aconteceu exatamente no tempo estabelecido por Deus. Nem antes, nem depois, mas no tempo certo.

A discussão em torno da data e das tradições ligadas ao natal pode ser instigantes e provocar nossa curiosidade, mas o que realmente importa é a razão do seu nascimento. Nessa carta escrita aos irmãos da Galácia, Paulo nos ajuda manter os olhos fixos no motivo da festa.

Dentro do cronograma de Deus, no tempo estabelecido por Ele, Jesus veio a esse mundo da forma mais natural que era possível, nascido de uma mulher. Não veio buscar glória para si, não veio cobrar nada de ninguém, não veio acusar ou condenar, veio para redimir o mundo. Segundo o dicionário, redimir é (1) obter novamente, (2) conseguir a libertação ou a salvação de outrem (3) tirar do perigo ou da condenação.

Então, Jesus veio para livrar o mundo do beco sem saída em que entramos com nossos próprias pés. Pensamos que a humanidade é esperta e que daremos conta do recado por nós mesmos, mas estamos perdidos e desorientados. Basta olhar pela janela para perceber que vivemos em um mundo inclinado ao erro e à destruição.

Esse é o beco sem saída da desconfiança, da falta de perspectiva para vida, da ausência de amor pelas pessoas, da mente atordoada, das emoções fora de controle, do apetite desordenado (por comida, sexo ou conhecimento); nesse beco por vezes estamos presos pelas correntes da arrogância. Jesus veio oferecer uma porta de saída. Ele disse: “Eu sou a porta”.

A saída do beco começa quando reconhecemos nossa incapacidade de sair com os próprios pés, decidimos confiar em Jesus e aceitar a sua ajuda e orientação. Essa atitude é comparada por Paulo a um órfão que se vê alvo do amor de uma família, se entrega aos seus cuidados, encontra ali um pai amoroso e protetor que o trata como filho e que ainda faz esse órfão herdeiro de sua herança.

Foi exatamente essa a boa notícia anunciada pelos anjos aos pastores de ovelha em Belém.


"Não tenham medo. Estou lhes trazendo boas novas de grande alegria, que são para todo o povo: Hoje, na cidade de Davi, lhes nasceu o Salvador que é Cristo, o Senhor. Lc 2.10,11

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