09 março 2006

O Dono da Festa

Por Aristarco Coelho

Certa vez um homem muito rico resolveu realizar uma festa em sua casa. Ele mandou preparar convites especiais e enviou para toda a cidade. O dono de festa preparou tudo com muito cuidado. Havia comidas deliciosas, bebidas especiais, música e um ambiente decorado com muito esmero. No dia da festa havia uma multidão, como se toda a cidade estivesse lá.

Um pouco depois de iniciada a festa, aquele homem resolveu andar pelo salão principal e ver como tudo estava acontecendo. Qual não foi a sua surpresa ao encontrar um homem cumprimentando a cadeira de madeira maciça que ficava em sua sala de estar.

O dono da festa ficou impressionado ao ver aquele homem agradecendo efusivamente a uma cadeira, que havia sido comprada no mercado, por haver sido convidado para aquela bela festa. O quadro ficou ainda mais incrível quando outras pessoas se juntaram àquele homem e começaram a aplaudir a cadeira e dizer uns para outros como a cadeira da sala era sábia.

- Uma excelente companhia! – disse um deles.

O dono da festa saiu daquele ambiente triste porque aquelas pessoas estavam satisfeitas com a companhia de uma cadeira de madeira e festejavam entre si a importância e a sabedoria de pedaços de madeira.

Ao sair da sala, depois de presenciar aquela cena, ele dirigiu-se para o jardim em frente da casa. O dono da festa era um homem muito criativo. Sua casa era bem decorada por dentro, e por fora havia um lindo jardim. Ele também gostava muito de animais. Ali ele deparou-se com um quadro não menos impressionante: uma mulher acabara de começar a agradecer ao seu cachorro pelo convite a tão bela festa. Falava bem da comida, farta e deliciosa, e embora o cachorro saísse desconfiado com aquele falatório, a mulher e outras pessoas explodiram em palmas e homenagens ao cachorro do dono da festa.


Algo realmente parecia estar errado. O dono da festa andou do por toda a casa e não foi sequer notado por muitas daquelas pessoas que ele mesmo havia convidado. Algumas delas estavam realmente se divertindo tanto que até se esqueceram da situação de convidados e agiam como se dono da casa fossem.

Em um grande salão, o dono da festa encontrou um grupo de pessoas que gesticulavam e falavam alto. Ao aproximar-se viu que eles conversavam sobre um de seus convidados mais especiais, um grande amigo seu. Ele ficou muito surpreso porque aquelas pessoas estavam afirmando que esse outro convidado era o verdadeiro dono da festa. Diziam que esse amigo comum era tão especial, uma pessoa tão boa, que tinha feito tanto bem aos outros que ele merecia ser o dono da festa.

Já desanimado, o verdadeiro dono da festa sentou na escadaria em frente a porta de entrada. Seu semblante já não era o mesmo do início da noite. Foi então que sua tristeza se completou. Ao olhar para o lado, viu um de seus convidados recebendo outros convidados e se apresentando como o dono da festa. Sem nenhum constrangimento, aquele homem estava em frente de uma casa que não era a dele, recebendo convidados que não eram dele. Mentindo para si mesmo e para os outros, ele cumprimentava a todos como se fosse o próprio dono da festa.

Cabisbaixo e triste com tudo o que havia visto, o dono da festa ficou muito desgostoso. Foi então que um pequeno grupo de pessoas aproximou-se dele e disse:

- Você é que é o dono da festa, não é?
- Sim, sou eu – disse o verdadeiro dono da festa.
- Nós vimos lhe prestar nossa homenagem por ter realizado uma festa tão linda – disseram eles. Queremos também lhe agradecer por nos ter convidado.

Depois de tudo que tinha visto, o dono da festa até ficou surpreso com aquilo, mas alegre por haver sido reconhecido. Então aquelas pessoas o aplaudiram por muito tempo e homenagearam o verdadeiro dono da festa.

Todos nós recebemos o dom da vida sem nada fazer por isso. Fomos convidados a participar da grande festa da vida e a considerá-la como um presente especial. Fomos convidados por Aquele que criou e mantém a vida. Veja cada um como decide tratar o verdadeiro Dono da Festa.

07 março 2006

Entre Livros - Edição Especial

CONTEÚDO
8 - Introdução O maior best-seller de todos os tempos
20 - Antigo testamento A história e a sabedoria do povo hebreu
46 - Novo testamento Jesus é o grande personagem que surge dos Evangelhos
58 - Literatura Os autores que recriaram passagens bíblicas
68 - Música O som que nasce inspirado no livro sagrado
74 - Artes e cinema O Novo Testamento aguça a visão e chega às telas
86 - Filosofia Com a pós-modernidade, leitura da Bíblia retorna
42 - AS TRADUÇÕES COMPARADAS
98 - COLABORADORES

Ler a Bíblia

Por Aristarco Coelho

Fala-se da leitura como uma ferramenta indispensável para a formação de pessoas capacitadas a articular suas idéias e apresentar seus pensamentos de maneira compreensível. E é isso mesmo! A leitura abre canais que tornam possível o que seria praticamente impossível sem ela: conhecer o pensamento, ouvir os lamentos de tristeza e os gritos de alegria de pessoas que jamais encontraríamos de outra forma.

Ao falar de leitura é importante resgatar a palavra encontro. Ler é encontrar-se com alguém. A leitura transformadora é o resulta de encontros especiais, calorosos debates de idéias, cálidos sussurros de confissão e até mesmo de encontros frios e lineares.

Não é diferente em relação à leitura da Bíblia. Considerá-la como um encontro, um diálogo, deixa-nos mais dispostos a nos relacionarmos com as pessoas por trás do texto. Assim, João, Lídia, Pedro, Amós, Noé e Rute mudam de classificação, deixam de ser figuras intocáveis e passam a se tornar gente de carne e osso que amou, odiou, sofreu, festejou e viveu a vida com lutas pessoais idênticas às nossas. Assim, ao me encontrar com eles na leitura da Bíblia, revivo suas dúvidas e certezas e encontro neles a identificação que me encoraja a permanecer no Caminho.

Um dos principais equívocos na promoção da leitura é tentar impô-la como uma espécie de poção mágica, como se ela fosse capaz de transformar instantaneamente. A leitura é transformadora quando se torna um hábito, e os hábitos são processos que levam toda uma vida para se consolidar. Quanto mais cedo a leitura faz parte da vida, melhor; quanto mais se lê, maior facilidade para seguir lendo; quanto mais aqueles em volta de nós gostam de ler, maior o nosso gosto pela leitura; enfim, quanto mais a leitura toca na realidade vida, mais ela se torna indispensável para nós.

Duas posições se apresentam quanto ao hábito da leitura da Bíblia. Por um lado alguns consideram que a formação do hábito não carece de prazer ou satisfação na leitura. Isto é, leia, continue lendo, permaneça lendo que em algum momento isso vai transformar-se em algo que lhe agrada. Não resta duvida que algumas das atividades das quais nem gostamos tornam-se habituais pela prática persistente. Esse caminho é razoável e tem sido seguido por muitas pessoas.

Mas, outras vezes os hábitos se formam a partir da satisfação em fazer algo que atende nossas necessidades. Não acho que devemos optar por um dos dois caminhos e descartar o outro, mas o hábito que se forma pelo prazer da necessidade atendida leva consigo algo muito poderoso.


Isso torna compreensiva a força da literatura de auto-ajuda. As respostas rápidas, simples e focadas nas necessidades são acolhidas com satisfação. No entanto, a leitura pode ser fazer bem mais que dar respostas. Ela pode nos ajudar a fazer perguntas capazes de sondar as entranhas da alma humana.

A dificuldade de trilhar esse caminho é que a leitura concorre com meios de comunicação que oferecem bem menos resistência à mente e que atrofiam a capacidade de expressão. Assim, alguns preferem ouvir um CD ou ver um DVD a ler um livro, inclusive sendo ele a Bíblia. A música e a imagem “passam direto” e nos enchem a pança de tanto doce que a fome de uma refeição mais elaborada desaparece. Nada contra um bom CD ou um DVD com bom filme. Eles também podem ser pontos de partida para a reflexão, mas a leitura é a mestra na arte de instigar o pensamento humano e deixar marcada a alma.

Segundo Eugene Peterson, o grande desafio na leitura bíblica é ouvir a Bíblia diz. Claro que não é caso de comprar um CD com o texto sagrado, mas de “ouvir” o significado que permeou o registro da palavra de Deus em cada acontecimento. Resgatar a poesia, a prosa, o humor, os épicos, as cartas e toda a diversidade literária da Bíblia pode nos ajudar a ouvi-la melhor. Ler mecanicamente cansa e deixa escapar importantes nuances do texto.

No entanto, parar e "ouvir" o que a Bíblia diz pede um estilo de vida diferente do que a maioria de nós tem. Parar e ouvir pede uma vida despida de complexidade e menos veloz. Isso nos coloca rapidamente em confronto com nosso modo urbano de viver, no qual a expressões como “meditar na sua lei de dia e de noite” parecem vazias de significado prático.


É fácil concordar com essa impossibilidade prática, principalmente se todos os canais da vida já foram ocupados. Por isso, parar e avaliar nosso estilo de vida é indispensável para que o hábito da leitura da bíblia encontre espaço e se estabeleça como uma resposta aos nossos anseios de significado para a vida. O desafio está lançado.