05 julho 2006

Oração pelo povo

Atilano Muradas

Deus, tenha misericórdia,
Das meninas, dos meninos,
Nas feiras, nas calçadas,
Abandonados.
Misericórdia!

Deus, tenha misericórdia,
Dos que estão encarcerados,
Inocentes ou culpados,
Discriminados.
Misericórdia!

Deus, tenha misericórdia,
Dos que estão desempregados,
Dos doentes e dos loucos,
Dos rejeitados.
Misericórdia!

Deus, tenha misericórdia,
Dos que matam pra viver.
Deus, tenha misericórdia,
Dos que roubam pra comer.
Deus, tenha misericórdia,
Dos que adusam do poder.
Deus, tenha misericórdia,
Dos que matam por prazer.

Deus, tenha misericórdia,
Dos que roubam as crianças
Para venderem os seus orgãos
Na madrugada.
Misericórdia!

Deus, tenha misericórdia,
Dos que em rituais macabros
Imolam sem piedade
Seres humanos.
Misericórdia!

Deus, tenha misericórdia,
Das mulheres e dos homens,
Que vendem os seus corpos,
E dos bastardos.
Misericórdia!

Deus, tenha misericórdia,
Das crianças que trabalham
Nas pedreiras e carvoeiras
Pra que outros enriqueçam.
Deus, tenha misericórdia,
Dos que nascem abortados,
Dos que, pela fome alheia,
Vivem bem alimentados.

Deus, tenha misericórdia,
Dos que estão aprisionados
Na bebida e nas drogas.
Dos solitários
Misericórdia!

Deus, tenha misericórdia,
Dos ateus e dos racistas,
Dos países em conflito,
Esfacelados.
Misericórdia!

Deus, tenha misericórdia,
Dos que são escravizados
Nos empregos, nas fazendas,
Acorrentados.
Misericórdia!

Deus, tenha misericórdia,
Dos que vivem favelados,
Dos mendigos e dos velhos
Em asilos e albergues.
Deus, tenha misericórdia,
Dos que negam em pão duro,
Dos que sem alternativa,
sobrevivem do monturo.

Deus, tenha misericórdia,
Dos que abusam das crianças,
Violentando suas almas
Desprotegidas.
Misericórdia!

Deus, tenha misericórdia,
Das florestas e dos bichos,
Do planeta enfumaçado
E espoliado.
Misericórdia!

Deus, tenha misericórdia,
Dos apátridas, dos índios
E de tudo mais que sofre
No universo.
Misericórdia!

Deus, tenha misericórdia,
Pra que a vida valha mais,
Valha mais do que dinheiro,
Valha mais do que poder.
Deus, tenha misericórdia,
Venha pois, nos socorrer,
Pra que a vida valha mais,
Seja melhor do que morrer.
Misericórdia!

03 julho 2006

Escolas municipais de SP terão aulas de religião

Por Renata Cafardo

SÃO PAULO - As escolas municipais de São Paulo terão aulas de ensino religioso a partir do ano que vem. O prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, sancionou a lei do vereador Domingos Dissei (PFL) que prevê a obrigatoriedade da disciplina - que havia sido vetada por Marta Suplicy. As escolas deverão oferecer religião, mas os pais decidirão se seus filhos vão ou não participar das aulas.

O vereador Dissei não soube explicar qual será o conteúdo da disciplina. Afirmou apenas que será "preciso respeitar a diversidade religiosa". "A presença de Deus é importante na vida da criança", disse. A lei prevê que as aulas sejam dadas no último horário escolar. A secretaria municipal divulgou nota informando que vai regulamentar a lei "sem ferir os princípios constitucionais de liberdade de credo".

Ainda não se sabe se todas as séries do ensino fundamental terão aulas de ensino religioso. Também não foi decidido quais professores darão a disciplina. O ensino religioso já existe na rede estadual de ensino paulista, apenas para a 8ª série, desde 2002. O conteúdo das aulas não é confessional e trata da história das religiões, dos pontos em comum entre elas e de tolerância. O aluno também não é obrigado a participar, e a secretaria estadual de Educação não sabe informar quantos dos 470 mil estudantes da 8ª série o fazem. Segundo o governo, os professores de história, filosofia e ciências sociais estão habilitados para dar a disciplina. Hoje, são 3.063 professores de ensino religioso na rede.

O ensino religioso é previsto pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), de 1996. Segundo o texto, o conteúdo da disciplina deve ser oferecido de acordo com as preferências dos alunos ou de seus responsáveis. A LDB permite que as aulas sejam confessionais ou interconfessionais.

A maior polêmica sobre o assunto ocorreu no Rio, em 2004. A governadora Rosinha Matheus decidiu que os alunos da rede estadual seriam separados por credo, para receber ensino religioso. E contratou professores para ensinar as doutrinas católica, evangélica, espírita, umbandista e messiânica.

Rosinha permitiu inclusive lições sobre criacionismo, teoria que se opõe ao evolucionismo e defende que o homem descende de Adão e Eva. Na época, a governadora afirmou que não acreditava na teoria de Charles Darwin.

Brasil

Estadão 03/07/06

02 julho 2006

Existe vida depois da França?

Zidane


A semana começou calma, quase silenciosa. Na verdade o silêncio começou ontem à tarde depois da derrota da seleção brasileira de futebol na copa do mundo. Ao final do jogo, talvez por questões ligadas à validade dos fogos de artifício, ouvi alguns estampidos e depois um silencio.

Passado o desconforto da derrota, penso que o desfecho, aparentemente trágico, na verdade será muito benéfico para o país. Voltamos à realidade! Embora seja uma realidade dura e difícil de enfrentar, ainda é a realidade e apenas se for encarada de frente é que poderá ser mudada.

Observando a reação das pessoas nesse domingo, fui bombardeado de perguntas para as quais ainda não tenho respostas.

Porque canalizamos nossas mais sublimes expressões de patriotismo para os esportes? Porque o coro “Eu sou brasileiro. Com muito orgulho, com muito amor” só é cantado com entusiasmo nos estádios de futebol? Porque só em eventos com a copa do mundo o sujeito resolve colocar uma bandeira de três metros na varanda do apartamento. Será possível corrigir esse viés de compreensão a respeito do amor à pátria e libertar o patriotismo do mundo dos esportes?

Porque a derrota para a França causou tanta indignação, mas a prostituição que submete milhares de brasileiras a derrotas muito maiores, dentro e fora do Brasil, não provoca um arroubo de indignação que seja?

Seria possível transportar o desejo de participar desses milhões de brasileiros que acompanharam cada movimento dos jogos em ações voluntárias para mudar a realidade dessa nação?

Seria possível que a educação (ou a falta dela) de milhões de brasileirinhos se tornasse motivo de conversas acaloradas e bate papos animados nos bares e restaurantes? Todos trocariam idéias sobre o assunto fariam sugestões mil sobre como melhorar o ensino nos próximos quatro anos!

Por que a ética e a preocupação com o bem comum não são enfrentados em espécies de campeonatos em que cada equipe treina (durante quatro anos) solidariedade, respeito pelo meio ambiente e pela vida humana? Os competidores disputariam para chegarmos à conclusão sobre quem proporcionou mais bem à sociedade.

Seria possível que o desejo por uma vida marcada pelo caráter de Cristo tomasse conta das igrejas, enfeitadas de bandeirolas e faixas, levando milhares a rever o egoísmo, as disputas irrelevantes, o farisaísmo, a falta de compromisso com os valores do Reino de Deus, o preconceito, a ambição e tantos outros pecados que assolam os templos e seus freqüentadores?

Porque não examinamos as propostas políticas, o currículo dos candidatos e história dos partidos com tanto esmero e cuidado como são examinadas as tabelas da copa? Seria possível marcar os placares dos movimentos políticos a exemplo do que fazemos na copa e acompanhar se os times vencedores a cada pleito cumprem o que prometeram?

Seria possível que em outros dias, sem jogo do Brasil, a família se reunisse, se abraçasse e festejasse cada avanço na construção de uma nação responsável, feita de homens e mulheres (e não de crianças) comprometidos sucesso uns dos outros? Talvez assim caminhássemos rumo à formação de um povo em que cada um abandonasse a lei do Gérson, que aliás era jogador.

Não tenho qualquer esperança de achar respostas fáceis para essas perguntas, nem acho que juntos somos capazes de tudo. Desconfio que haja uma falha estrutural em todos os seres humanos. Uma falha que tem nos prejudicado há milênios: uma terrível desconfiança a respeito do caráter do Doador da Vida nos deixou sem lenço e sem documento, em um universo sem propósito e vivendo uma vida sem destino. E talvez por isso estejamos tão confusos e procurando propósitos elevados em partidas de futebol.

Imagino que haja resposta para todas as perguntas, mas cansei de perguntar! Hoje é domingo. Amanhã, vou por o pé na estrada e fazer a minha parte nessa busca.